Na abertura do seminário Temas de Direito e Economia, realizado nesta terça-feira (20) no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux afirmou que os países com Justiça mais eficiente ocupam as primeiras posições no ranking das boas economias. O evento está sendo transmitido ao vivo pelo YouTube.
Segundo o ministro, o bom funcionamento do Judiciário é condição essencial para a melhoria do cenário econômico.
“Ter um sistema processual eficiente significa atrair mais investimentos para o Brasil. As mudanças para tornar a Justiça mais eficiente já produzem efeitos. O aumento nos investimentos é algo que já estamos assistindo aos poucos”, comentou o ministro ao falar sobre o ambiente de negócios no país.
Fux citou como exemplo um levantamento da revista Forbes, segundo o qual todas as 500 maiores empresas do mundo possuem um centro de operações em um condado do Texas devido ao bom funcionamento da Justiça naquela região – a taxa de litigância é de apenas 2% e a aplicação da jurisprudência é estável.
Participaram da mesa de abertura do seminário o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro; os ministros do STJ Nancy Andrighi e Villas Bôas Cueva, e o titular da Secretaria Nacional do Consumidor, Luciano Timm.
Execução provisória
No primeiro painel, “Análise Econômica do Crime e Pacote Anticrime”, Sergio Moro abordou a possibilidade da execução provisória da pena após a condenação em segunda instância, citando dados do STJ e do STF para justificar a medida.
Segundo o ministro, um estudo recente mostrou que o provimento de recursos especiais pelo STJ para absolver o acusado ocorre em apenas 0,62% dos casos, ao passo que, entre os recursos extraordinários (julgados pelo STF), a taxa é de 0,035%.
Diante desses números, Moro afirmou que a exigência de trânsito em julgado do processo, como condição para o início da execução da pena, “é um benefício muito pouco significativo para o acusado”.
Ele explicou que, embora seja preciso garantir à defesa o direito de recorrer, a execução provisória da pena – admitida atualmente pela jurisprudência do STF e prevista no pacote anticrime enviado ao Congresso – inverte a lógica: “A regra é a execução da pena após a segunda instância, mas pode ser atribuído efeito suspensivo ao recurso especial ou extraordinário, dependendo do caso. Essa regra é coerente com o percentual de provimento de recursos especiais e extraordinários”.
Motivação para crimes
O professor Pery Shikida, membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), apresentou estudos feitos com condenados para averiguar a motivação que os levou a cometer crimes econômicos.
De acordo com o professor, os estudos demonstraram que a tese de que os crimes seriam decorrentes da desigualdade social e da pobreza é uma falácia, já que a proporção entre o benefício do crime e o custo (possível prisão, por exemplo) é o grande fator que motiva os criminosos.
“A ideia de ganho fácil é o item mais apontado pelos criminosos. É falaciosa a ideologia que propaga que os crimes são cometidos em razão da pobreza. Os pobres merecem mais respeito”, argumentou o professor.
Ele sustentou a necessidade de endurecimento de penas e fortalecimento das instituições como medidas para diminuir a criminalidade.
“A chance de sucesso chega a 95% no casos de alguns crimes econômicos. É preciso ter polícia e Justiça efetivas, além de fortalecer família, emprego e instituições. Se você não cumprir a lei, o Estado será uma ameaça crível”, destacou Pery Shikida ao elogiar o pacote anticrime enviado pelo governo ao Congresso.
O painel foi moderado pelo conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Márcio Schiefler Fontes.
Litigiosidade
“Análise econômica da litigância e discussão de projetos de lei em curso” foi o tema do segundo painel do seminário, moderado pelo ministro do STJ Luis Felipe Salomão.
O juiz federal Erik Navarro analisou a alta litigiosidade do Brasil com base em um estudo probabilístico das demandas. Segundo o magistrado, o otimismo dos advogados, aliado à falta de aplicação da jurisprudência, torna o cenário favorável à judicialização, já que as partes acreditam que vão ganhar e acabam rejeitando um acordo.
“Nós só temos uma média de 10% de acordos, enquanto em outros países essa taxa chega a 90%, 95%”, comentou. Outro fator apontado por Navarro foi o benefício da gratuidade da Justiça.
“A gratuidade da Justiça acaba incentivando a parte a participar de um jogo com pouca probabilidade de êxito, mas sem o risco de perder. É preciso racionalizar a concessão da gratuidade”, completou o juiz.
A professora do Insper Luciana Yeung falou sobre a análise de impacto regulatório – tema que, segundo ela, já está consolidado em muitos países.
Yeung afirmou ser um mito a ideia de que o Estado não fará qualquer tipo de intervenção na economia, e é necessário discutir o papel da regulação com base em dados e fatos concretos. “A qualidade da regulação impacta o desempenho econômico; por isso, a regulação tem que ser feita de forma técnica”, afirmou.
Isto evita, segundo a professora, a regulação com efeito “bumerangue”, pensada para ajudar o cidadão, mas que acaba se voltando contra ele. Luciana Yeung disse que a análise de impacto regulatório tem de ser feita com base nos critérios de economicidade, efetividade, eficácia e eficiência.
Liberdade econômica
A etapa matinal do seminário foi encerrada com um painel sobre análise econômica do direito empresarial e dos contratos, e o caso da Medida Provisória 881, a chamada MP da Liberdade Econômica.
O painel foi presidido pelo secretário nacional do Consumidor, Luciano Timm, que também proferiu palestra na qual lembrou que o Brasil tem a intenção de se tornar membro da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e, por isso, precisa observar as orientações da entidade. Entre essas orientações, destacou o secretário, está o diálogo entre a defesa da concorrência e o direito do consumidor.
Segundo Timm, a desburocratização diminui custos e outras barreiras às transações comerciais, melhorando o ambiente de negócios, especialmente para pequenas e médias empresas. “Desburocratizar é garantir um direito fundamental aos indivíduos e empresas”, declarou.
O diretor de Programa de Liberalização do Ministério da Economia, Geanluca Lorenzon, disse que todos os países desenvolvidos passaram por uma etapa de “capitalismo selvagem”, e indagou se o Brasil poderia atingir níveis mais elevados de desenvolvimento sem atravessar o mesmo processo.
Observando que o contrato social é anterior ao próprio Estado, Lorezon afirmou que um ambiente de segurança jurídica é necessário para a prevalência das balizas estabelecidas nos contratos. Segundo ele, “segurança jurídica para a economia de mercado é saber que o trato será cumprido”.
O painel foi concluído pelo diretor de Registro Empresarial do Ministério da Economia, André Luiz Santa Cruz Ramos. O diretor apresentou pontos importantes da MP 881 – que pode ser votada ainda nesta terça-feira pela Senado –, como os critérios para a desconstituição da personalidade jurídica e a função social dos contratos.
Para Santa Cruz Ramos, a desconsideração da personalidade jurídica recebeu “tratamento detalhado” na MP, com ênfase na importância da separação patrimonial e das limitações de responsabilidades. “É quase um consenso a banalização da desconstituição da personalidade jurídica no Brasil”, afirmou o diretor do Ministério da Economia.