O Senado promoveu 175 audiências públicas entre fevereiro e julho deste ano. Foram 160 eventos nas 13 comissões temáticas permanentes da Casa, além de oito debates conjuntos (com dois ou mais colegiados) e sete realizados em subcomissões.
Um tema que mobilizou parlamentares e especialistas foi a possibilidade de mudança na política de reajuste do salário mínimo. Em audiência da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), os convidados alertaram para o risco de empobrecimento dos trabalhadores brasileiros. O debate realizado em maio foi requerido pelo senador Paulo Paim (PT-RS), presidente da comissão.
Até 2019, o valor do mínimo era calculado partir de critérios definidos na Lei 13.152, de 2015. O reajuste era calculado com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) somado à variação do produto interno bruto (PIB) de dois anos anteriores. A partir de 2020, o governo federal pretende usar como parâmetro apenas a inflação, o que para representantes sindicais significa retrocesso.
O técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clóvis Scherer, lembrou que a pobreza e a concentração de renda no Brasil aumentaram nos últimos dois anos. Ele também destacou o longo caminho percorrido até a adoção da fórmula de cálculo em vigor.
— Foram várias marchas a Brasília realizadas a cada ano, entre 2004 e 2009, que trouxeram como ponto principal a necessidade de erguer o valor do mínimo e levá-lo a um patamar de dignidade. Na América do Sul, a maioria dos países está com salários mínimos em patamares superiores ao nosso. Nada fizemos além de recuperar um nível de renda que já foi alcançado no país anteriormente — avaliou.
A representante do Sindicato dos Auditores Fiscais do Trabalho, Mônica Damous Duailibe, ressaltou a importância do salário mínimo e a necessidade de sua valorização. Segundo ela, o número de empregados formais no Brasil cresceu de 23 milhões para 39 milhões entre 2002 e 2014 — justamente o período de maior valorização do benefício.
Para a senadora Zenaide Maia (Pros-RN), a perda do poder aquisitivo dos trabalhadores tem consequência imediata na economia.
— Isso não é questão de partido. É uma questão de país. Se você tira o poder de compra, tira o poder de venda. Se o comércio não vende, a indústria não produz e o governo não arrecada — disse.
Relações Exteriores
Outro assunto que provocou debates no Senado foi a crise na Venezuela. Em maio, o presidente a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado (CRE), senador Nelsinho Trad (PSD-MS), manifestou “profunda preocupação com a situação do país vizinho”, que enfrentou a morte de civis em decorrência do acirramento dos conflitos entre governo e oposição.
— Reiteramos nossa expectativa de uma transição democrática em um processo pacífico e de respeito aos direitos humanos. Nosso país continuará a exercer pressão diplomática — afirmou Nelsinho.
Outros senadores ressaltaram a tradição diplomática brasileira e rechaçaram qualquer intervenção militar do Brasil na Venezuela. Líder da minoria no Senado, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse que o Brasil não pode ser “porta-voz de nenhuma aventura bélica e militar no país vizinho”.
— A ditadura existente na Venezuela deve ser esgotada de forma diplomática — defendeu.
O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) avaliou que a situação na Venezuela e na fronteira brasileira, em especial no município de Pacaraima (RR), é “dramática”. Segundo ele, o governo não tem interesse em se envolver em um conflito militar contra a Venezuela, mas tem agido no sentido de garantir assistência e ajuda humanitária aos venezuelanos que se refugiam no Brasil.
— É um problema que só vai se resolver ao se restabelecer a democracia na Venezuela — afirmou.
Maconha
Outro tema polêmico enfrentado pelos parlamentares foi o uso medicinal da maconha. O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) é relator de uma sugestão legislativa (SUG 6/2016), apresentada pela Rede Brasileira de Redução de Danos e Direitos Humanos, que estabelece regras para fiscalização e tributação da maconha medicinal. Se for aprovada pela CDH, a sugestão passa a tramitar como projeto de lei.
O Senado analisa ainda o projeto de lei (PLS) 514/2017, que prevê o uso terapêutico da Cannabis sativa. De autoria da CDH, o texto altera a Lei 11.343, de 2006, conhecida como Lei das Drogas, para autorizar a semeadura, o cultivo e a colheita da substância para uso pessoal terapêutico, de acordo com prescrição médica. O projeto aguarda o relatório do senador Carlos Viana (PSD-MG) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Em julho, uma audiência pública da CDH colocou frente a frente representantes do governo e das famílias que defendem a regulamentação da maconha para uso medicinal. O ministro da Cidadania, Osmar Terra, reforçou a política “proibicionista” e disse que a liberação do plantio poderia “abrir as portas para o consumo generalizado de drogas”. De outro lado, pais e mães de crianças que sofrem com uma série de doenças e condições como a epilepsia e o autismo pedem que o Congresso autorize o cultivo da maconha.
O ministro afirmou que a maconha é a porta de entrada para outras drogas e que 25% da população é muito vulnerável à dependência química. Osmar Terra afirmou que a regulamentação da maconha aumentou a violência e o número de acidentes no trânsito em vários países.
— Eu sei que aqui tem mães carinhosas preocupadas, que vão até o fim do mundo para salvar seus filhos e para aliviar o sofrimento dos seus filhos. Elas têm que ter um apoio necessário. Agora, eu poderia fazer uma reunião aqui com as mães que perderam os filhos para a droga, que são muito mais numerosas — disse o ministro.
Cidinha Carvalho é presidente da Associação de Cannabis e Saúde (Cultive). A filha dela, de 16 anos, foi diagnosticada com síndrome de Dravet e tinha convulsões desde antes do primeiro ano de vida. Segundo Cidinha, a qualidade de vida da família melhorou depois que a menina começou a usar substâncias extraídas da maconha.
— A dor não pode esperar. Se eu tivesse esperado por uma regulamentação para poder cultivar para a minha filha, para poder dar um óleo para a minha filha, não sei se eu teria minha filha aqui hoje porque a síndrome dela tem risco de morte súbita. Se fosse seu filho você esperaria pela regulamentação? — questionou Cidinha.