Diante da recusa da Prefeitura de Manaus e do Governo do Amazonas em responder e acatar a recomendação expedida pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública da União (DPU) sobre o atendimento emergencial à população em situação de rua diante da Covid-19, os órgãos obtiveram adesão também do Ministério Público do Trabalho da 11ª Região e divulgaram nesta sexta-feira (3), uma nota pública em que expõem a falta de medidas eficazes por parte do município e do estado para atuar frente a esse problema e ressaltam a possibilidade de adoção de medidas judiciais, caso a situação persista.
Confira a íntegra da nota:
NOTA PÚBLICA
O Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho e a Defensoria Pública da União vêm a público manifestar extrema preocupação diante da ausência de atuação efetiva dos Poderes Público Estadual e Municipal em prol da população em situação de rua no contexto de alastramento da covid-19 no estado do Amazonas.
No dia 25 de março deste ano, considerando a situação de calamidade pública existente no País decorrente das previsões de colapso do sistema público de saúde, o MPF e a DPU recomendaram ao Estado do Amazonas e ao Município de Manaus a adoção de 19 medidas em favor da população em situação de rua, que apresenta vulnerabilidade elevada à moléstia, dadas à má nutrição, as péssimas condições de higiene e as doenças preexistentes a que se encontram submetidas. No entanto, não houve respostas formais por parte do Estado e do Município quanto à adoção das providências recomendadas.
Após a realização de duas reuniões por videoconferência com representantes de secretarias estaduais e municipais (SEJUSC, SEAS, SEMMASC, SUSAM e SEMSA), nos dias 31 de março e 03 de abril deste ano, e de duas verificações feitas pelo MPT e pela Pastoral do Povo de Rua à Arena Amadeu Teixeira e ao CECI Aparecida, os três órgãos constataram que a população em situação de rua segue desacolhida, desinformada quanto aos riscos da covid-19 e sem receber os cuidados necessários, tais como higienização e equipamentos de proteção.
Até o momento, Estado do Amazonas e Município de Manaus não empregaram esforços suficientes à elaboração e à implantação de um plano unificado de atuação emergencial para a população em situação de rua.
A iniciativa na Arena Amadeu Teixeira, alardeada pelo Governo do Estado de modo a atrair a população para seu entorno, porém com demora de mais de uma semana para início do acolhimento, mostrou-se insuficiente para a demanda existente, em muito superior ao número estimado pelo Estado, de 200 pessoas. Isso tem resultado em situações graves no local, tais como: aglomeração de pessoas em filas nos locais de distribuição de refeições, sem a observância da distância mínima necessária a evitar o contágio; longas filas para a realização de triagem, sendo a capacidade de atendimento dentro da arena inferior à divulgada; ausência de local adequado para proteção contra intempéries, estando a população que aguarda atendimento e que utiliza os serviços de higienização (banho) e refeições desprotegida; ausência de estrutura mínima a possibilitar banhos e uso de sanitários pelas pessoas que aguardam na área externa; trabalhadores (servidores e voluntários) sobrecarregados; atendimento realizado de forma que compromete a saúde e a segurança dos trabalhadores e dos usuários; ausência de sinergia entre os entes públicos entre si e com as organizações da sociedade civil atuantes na temática.
Desse modo, considerando que os Poderes Públicos Estadual e Municipal ainda não adotaram medidas suficientes para atender às recomendações expedidas, com as providências necessárias a oferecer condições dignas à população em situação de rua no quadro atual de crescimento da pandemia (ressaltando que esta população também sobrecarregará o SUS no caso de não ser evitado o contágio com a adoção das medidas recomendadas), o MPF, o MPT e a DPU no Amazonas analisam a adoção de medidas judiciais, que podem se tornar as únicas capazes de mobilizar mais fortemente o Estado do Amazonas e o Município de Manaus para os direitos das pessoas em situação de rua, de modo a evitar uma tragédia de proporções inimagináveis a essa população, tão historicamente marginalizada.
Manaus, 03 de abril de 2020.
Fernando Merloto Soave
Procurador da República
Alzira Melo Costa
Procuradora do Trabalho
Luís Felipe Ferreira Cavalcante
Defensor Público da União