A Justiça Federal recebeu denúncia do Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas contra Mouhamad Moustafa, José Lopes, Priscila Marcolino Coutinho e Edite Hosoda Monteiro por lavagem de dinheiro. A denúncia faz parte dos desdobramentos da Operação Eminência Parda, quinta fase da Operação Maus Caminhos.
No documento, o MPF aponta que, entre março de 2014 e julho de 2016, o empresário José Lopes recebeu de Mouhamad Moustafa, com a finalidade de ocultação, 25 parcelas mensais de R$ 1,04 milhão, totalizando R$ 26 milhões, valores estes provenientes dos crimes de peculato já denunciados em outras fases da Maus Caminhos. Na denúncia, o órgão relata que os pagamentos eram feitos quase sempre pessoalmente, na casa do empresário, escolhido para operar a lavagem de dinheiro em razão de possuir parte de seus negócios relacionados à pecuária e, por isso, lidar com grandes quantias em espécie de forma corriqueira, facilitando a inclusão dos valores no mercado.
Para a viabilização financeira dos repasses e, consequentemente, da lavagem de dinheiro desviado dos cofres públicos, Mouhamad Moustafa recebeu o auxílio de Priscila Marcolino, responsável por efetuar saques, juntar as quantias e separá-las em pacotes. Já Edite Hosoda, funcionária de confiança de José Lopes há décadas, também participou do crime em pelo menos uma oportunidade, tendo recebido, no mínimo, R$ 264 mil das mãos do médico.
O MPF apresenta, na denúncia, tabelas e gráficos que demonstram uma evolução extraordinária do patrimônio pessoal e empresarial de Mouhamad Moustafa a partir do início do esquema de desvio de verbas da saúde, por meio do Instituto Novos Caminhos. Nesse período, o grupo econômico liderado pelo médico passou a movimentar mais de R$ 121 mi a mais do que registrava antes da prestação de serviços à organização social. Por isso, a denúncia aponta que os valores entregues por Moustafa a José Lopes, provenientes das contas bancárias de suas empresas e até de suas contas pessoais, eram, necessariamente, frutos dos crimes de peculato praticados pelo acusado.
A ação penal tramita na 2° Vara Federal no Amazonas sob o número 1012389-71.2019.4.01.3200. Todos os acusados responderão pelo crime de “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal”, previsto no artigo 1º da Lei 9.613/98, e estão sujeitos a penas que podem variar de três a 10 anos de prisão e multa, podendo ser aumentada em até dois terços para José Lopes, Mouhamad e Priscila porque cometeram o crime diversas vezes, de forma continuada.
Diálogos dissimulados – Informações obtidas a partir da extração de dados do celular de Mouhamad e da quebra do sigilo bancário de suas empresas também foram reunidas na ação do MPF para comprovar a existência das entregas dos valores para ocultação. Em diálogos citados na denúncia, Mouhamad e José Lopes fingem tratar sobre assuntos médicos e manter uma suposta relação médico-paciente. A linguagem cifrada com Lopes tinha como objetivo mascarar o real conteúdo das conversas: a remessa de valores em espécie. Esta conclusão é possível porque, nos exatos dias em que Mouhamad agendava alegadas ‘consultas médicas’, ordenava que Priscila providenciasse elevadas quantias em espécie com o objetivo de entregá-las a José Lopes.
O cruzamento das informações obtidas mostra que, em nove oportunidades, a compensação de cheques e saques de contas bancárias das empresas de Mouhamad ocorreu poucos dias antes dos encontros entre o médico e José Lopes. Ainda conforme apurou o MPF, em outras oportunidades, os pagamentos foram cobertos, provavelmente, com recursos que o médico guardava nos cofres de sua casa, já que as investigações, desde a primeira fase da operação, revelaram ser um costume do acusado.
Evidências da prática de crimes – Três fortes evidências reforçam a tese do MPF sobre a intenção de Moustafa e Lopes em ocultar a origem ilícita do dinheiro desviado. Primeiro, considerando que é evidente a relação entre a movimentação de ativos em espécie e os encontros, o fato de ambos os réus terem negado, em interrogatórios policiais, que houve a movimentação de recursos em espécie esclarece, conforme a denúncia, a intenção de ocultar tais movimentações, numa forma de ‘escape’ aos valores oriundos dos crimes de peculato.
Em segundo lugar, o MPF sustenta que os réus criaram uma frágil história falsa, concretizada na relação entre médico e paciente. Os diálogos não demonstram nenhuma característica que comprove essa relação. Em nenhuma das mensagens analisadas foi apurada queixa ou reclamação de dor ou qualquer outro tipo de mal estar por parte do suposto paciente, nem sequer uma mensagem em que José Lopes relatasse desconforto que demandaria a pronta visita de Mouhamad. As mensagens se concentravam na marcação dos encontros, sem maiores rodeios.
Por último, Mouhamad tinha o cuidado de juntar cifras milionárias em espécie, o que demanda planejamento e organização, assumindo riscos de furtos ou roubos para não deixar rastros das movimentações.