Ao negar a concessão do BPC na via administrativa, a autarquia federal alegou que a autora da ação não preenchia os critérios legais.
O juiz Túlio de Oliveira Dorinho, respondendo pela 1.ª Vara da Comarca de Iranduba, condenou o INSS a implantar benefício assistencial a pessoa com deficiência a uma mulher acometida de câncer de cólon, que havia tido o benefício negado pelo Instituto, na via administrativa, sob a alegação de que a autora não preenchia os critérios legais.
Conforme o Processo n.º 0600597-42.2019.8.04.4600, a requerente havia ingressado com pedido de concessão do Amparo Assistencial à Pessoa Portadora de Deficiência – LOAS, informando estar acometido de neoplasia maligna do cólon (CID 10 C18), o que a deixava impossibilitada de exercer qualquer atividade profissional, conforme laudos acostados aos autos.
Ao contestar a ação, o INSS requereu pela improcedência da demanda, “pois não comprovado pela parte a hipossuficiência econômica, requisito essencial para a obtenção do benefício”, frisando tratar-se “de prova constitutiva que cabe à parte que alega possuir o direito”.
A pedido da autora da ação, o juiz determinou a realização de prova pericial e de estudo socioeconômico, objetivando responder, inclusive, a questionamentos pontuados pelo órgão previdenciário na peça de contestação.
No relatório que precede a sentença, o juiz destacou que a pretensão da autora encontra guarida no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, o qual prevê a garantia mensal de um salário mínimo de benefício à pessoa portadora de deficiência e ao idoso, quando não possuir meios de prover o próprio sustento ou tê-lo provido por sua família; o que tem sido confirmado na atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).
O magistrado citou, ainda, a Lei n.º 8.742/93 – que dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências – cujo art. 20, em seu parágrafo 1.º, considera que a família é composta pelo requerente; o cônjuge ou companheiro; os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto; os irmãos solteiros; os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
O parágrafo 2.º do mesmo artigo 20 prevê que para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física; mental; intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Complementarmente, o parágrafo 3º do mesmo dispositivo fixa que “(…) Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família o cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
Destacou ainda o juiz que, no parágrafo 11 do art. 20, ficou estabelecido que: “(…) Para concessão do benefício de que trata o caput desse artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento”.
Ao considerar que a autora preenche todos os requisitos necessários à concessão do benefício postulado, o juiz Túlio Dorinho registrou que o requisito relativo à incapacidade, principalmente para o trabalho, encontra-se demonstrado nos autos, conforme laudo referente à perícia médica e relatório da avaliação social. Além disso, depreende-se das informações obtidas que a família vivencia uma situação de vulnerabilidade social, com renda familiar per capita inferior a de um salário mínimo, portanto, renda incapaz de suprir as necessidades básicas com alimentação, vestuário, educação e medicação.
“(…) a jurisprudência que vem se consolidando nos Tribunais pátrios é no sentido de que o preceito contido no § 3.°, do art. 20, da Lei 8.742/93, não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. Ora, conforme melhor entendimento, o critério objetivo atinente a renda mensal familiar per capita mostra-se insuficiente para atestar se o idoso ou o deficiente não possuam meios de prover o próprio sustento ou tê-lo provido por sua família. Na realidade, tal quantum deve ser considerado como um limite mínimo, um parâmetro para aferição da necessidade, não impedindo, contudo, que outros elementos sejam utilizados para comprovar a carência de condições de sobrevivência digna”, afirmou o magistrado, citando entendimento, no mesmo sentido, do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RESP 841.060/SP, relatado pela ministra Maria Thereza de Assis Moura; e do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, em julgamento da AC 2008.01.99.056152-3/MG, relatado pelo desembargador federal Antônio Savio De Oliveira Chaves, da Primeira Turma.
“Nesse contexto, entendo que o conjunto probatório colhido nos autos demonstra de forma satisfatória a condição de miserabilidade da autora, conforme consta no relatório social, sendo certo que o fato de sobreviver sem renda fixa, já é requisito preponderante para provar o alegado. Ademais, o benefício assistencial em tela, será revisto e poderá, havendo mudança de condição de necessidade da parte autora, cessar nos termos do art. 21 e ss. da supracitada lei. Nessa premissa, infere-se que o pedido exordial foi regularmente instruído com o início de prova material necessária, ratificado, de forma clara e lógica, pelas testemunhas, pelo laudo pericial conclusivo e pelo relatório da avaliação social, no bojo dos autos”.
O juiz determinou que o pagamento do benefício seja retroativo à data do requerimento administrativo perante o INSS, março de 2018, incidindo sobre as parcelas vencidas correção monetária e juros moratórios calculados pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos do art. 1.º F da n.º Lei 9.494/97 (alterada pela lei 11.690/2009), devendo estas parcelas serem pagas no prazo de trinta dias após a intimação, sob pena de multa de R$ 500 por dia de atraso no cumprimento da ordem judicial, independentemente do trânsito em julgado da sentença, até o limite de R$ 5 mil, que serão revertidos em favor da parte autora.
A sentença, proferida no último dia 19 de dezembro de 2020 pelo juiz Túlio de Oliveira Dorinho, foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico do último dia 12 de fevereiro (pág. 20 do Caderno Judiciário).
Terezinha Torres
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