STF retoma julgamento de ações contra Lei de Responsabilidade Fiscal
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, em sessão extraordinária na manhã desta quarta-feira (21), o julgamento conjunto de oito ações que questionam a constitucionalidade da Lei Complementar 101/2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Estão em julgamento as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 2238, 2324, 2256, 2241, 2261, 2365, 2250 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 24.
O julgamento foi retomado com a manifestação do relator, ministro Alexandre de Moraes. Diante da complexidade do caso, ele dividiu as 140 páginas de seu voto em tópicos para facilitar a análise de mérito de cada dispositivo questionado e usou a ação mais abrangente – ADI 2238, ajuizada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e pelo Partido dos Trabalhadores (PT) – como paradigma.
Federalismo fiscal
No primeiro tópico, o relator rebateu as alegações de que a LRF afronta o princípio constitucional do federalismo. Em decisão unânime, o Plenário julgou improcedente a ação em relação à parte final do inciso II do parágrafo 2º e ao parágrafo 4º do artigo 4º da lei. Para o ministro Alexandre de Moraes, não há desrespeito ao sistema de autonomias recíprocas e de repartição de competências administrativas, mas fortalaecimento do federalismo fiscal responsável.
O relator explicou que o legislador atribuiu à União a competência para legislar sobre finanças públicas por meio de lei complementar, como no caso. No seu entendimento, as capacidades fiscais numa federação cooperativa devem ser exercidas com a visão de conjunto, para um desfecho harmônico, sem a pretensão de reduzir a política estadual e a municipal.
Para o ministro Alexandre de Moraes, as metas fiscais devem levar em consideração questões da economia nacional, para não se tornarem meras peças de ficção. “Seria absolutamente ilógico, sem qualquer razoabilidade, que estados e municípios, nas suas leis de diretrizes orçamentárias, estipulassem metas ignorando a taxa de juros, o crescimento do PIB, a inflação”, afirmou.
Transferências voluntárias
Com relação ao questionamento do parágrafo único do artigo 11, o ministro também votou pela improcedência da ADI, sendo acompanhado pelos demais ministros. O dispositivo questionado enumera os requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal para arrecadação de tributos de competência constitucional do ente da Federação e veda a realização de transferências voluntárias para o ente que não observe tais requisitos. Ao analisar esse tópico, o relator afirmou que não houve desrespeito ao sistema tributário e de distribuição de receitas, uma vez que a LRF estabelece requisitos essenciais para essa repartição, cabendo aos estados e municípios criarem também as suas fontes de renda.
O relator afirmou que não houve na LRF qualquer alteração quanto aos repasses obrigatórios que a União deve fazer aos entes federados, tendo a legislação criado mais rigor para que a União proceda as transferências voluntárias. “O estado ou município que não institui os seus tributos, que não arrecada os seus tributos, não será penalizado, mas não será beneficiado com uma transferência voluntária. Em momento algum se prevê que perderá a transferência obrigatória, até porque isso seria inconstitucional”, explicou o relator.
Para o ministro Alexandre de Moraes, a intenção da lei foi evitar o desequilíbrio fiscal, a dependência da União e impedir que entes federados deixem de editar normas sobre seus tributos para reivindicar transferências voluntárias da União. Com isso, o Tribunal, por unanimidade, afastou as alegações e manteve a legalidade do dispositivo questionado.
Renúncias fiscais
Ao analisar o artigo 14, inciso II, da LRF, que trata das formas de compensação fiscal que o ente federado deverá buscar para cobrir o que deixa de arrecadar por concessão de renúncias fiscais, o ministro-relator também manteve a integralidade da lei. Seu voto foi acompanhado pelos demais ministros. O ministro Alexandre de Moraes advertiu que a lei estabelece a necessidade de uma ação planejada, exigindo responsabilidade e transparência para evitar o endividamento voluntário.
Citando a situação fiscal do Estado do Rio de Janeiro, o relator lembrou que foi o estado que mais concedeu renúncias fiscais, entrando em situação financeira caótica. “O que o artigo 14 propõe é reorganizar uma estratégia para que os impactos quanto à concessão de benefícios fiscais sejam mais bem quantificados”, afirmou, lembrando que tudo deve estar previsto no orçamento.
Admissibilidade
No início do julgamento, o ministro Alexandre Moraes examinou o conhecimento das ações, ou seja, a viabilidade de se admitir seu prosseguimento. Por unanimidade, o Plenário seguiu o voto do relator em todos os pontos.
A ADI 2365, ajuizada pelo PCdoB contra o artigo 20, inciso III, da LRF, que trata da a despesa total com pessoal na esfera municipal, foi julgada totalmente improcedente. Isso porque o partido questionava dispositivo da Constituição Federal incluído pela Emenda Constitucional 25/2000, que entrou em vigor em 1º/1/2001, momento posterior ao ajuizamento da ADI, quando a lei já se encontrava em vigor, o que não é cabível na análise desse tipo de ação.
Pelo mesmo motivo, foi considerada prejudicada a ADI 2238 quanto ao artigo 72 da norma porque o dispositivo previa que seus efeitos perdurariam até o término do terceiro exercício seguinte ao ano da publicação da LRF, ou seja, 2003.
Os ministros também não conheceram da ADI 2238 no ponto em que o PCdoB apontou incompatibilidade entre o artigo 7, parágrafos 2º e 3º, da Lei de Responsabilidade Fiscal, com o artigo 4º da MP 1980/2018, já que a legenda não apresentou nenhuma violação à Constituição.
A ADI 2238 foi considerada prejudicada em relação ao questionamento do artigo 30, inciso I, parte final, da LRF, pois o dispositivo era de caráter temporário e já teve a sua vigência esgotada. Tratava-se de prazo de 90 dias para a proposição de lei complementar sobre limites globais das operações de crédito externo e interno da União, dos estados e dos municípios.
O Plenário não conheceu da ADI 2238 na parte que questiona o artigo 15 da Lei de Responsabilidade Fiscal por ausência de impugnação de todo o complexo normativo necessário. Isso porque o dispositivo remete aos artigos 16 e 17, que tratam do aumento de despesa e da despesa obrigatória de caráter continuado. Segundo o ministro Alexandre de Moraes, só se poderia cogitar da inconstitucionalidade do artigo 15 caso os demais também fossem questionados.
Os ministros votaram pela improcedência da ADI 2238 no tocante à constitucionalidade formal de alguns dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, assim como da ADI 2261, ajuizada pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, que pedia a declaração de inconstitucionalidade do artigo 20 da norma.
Um dos argumentos dos autores das ações era que houve mudanças significativas feitas no Senado Federal que não retornaram para análise da Câmara dos Deputados. No entanto, o ministro Alexandre de Moraes sustentou que não houve alterações de redação, mas apenas um novo esquema de enunciação dos dispositivos.
O ministro Alexandre de Moraes rejeitou a alegação de que a LRF regulamentou parcialmente o artigo 163 da Constituição Federal, que trata da edição de lei complementar sobre finanças públicas, sem ter abrangido temas constantes nos incisos V e VII, os quais versam sobre fiscalização financeira da administração pública direta e indireta e a compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União. Apontou, ainda, que não é obrigatório apenas lei complementar para regulamentar o artigo 163, pois o dispositivo aborda assuntos diversos.
RP, AR/CR
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