O Congresso Nacional deve promulgar no início de agosto a proposta de emenda à Constituição (PEC) que altera as regras e prazos de tramitação de medidas provisórias (MPs).
Aprovadas pelos senadores em 12 de junho, depois de oito anos de tramitação no Parlamento, as novas normas determinadas pela PEC 91/2019 asseguram ao Senado pelo menos 30 dias de prazo para analisar as medidas provisórias editadas pelo Poder Executivo. Para que as mudanças entrem em vigor, falta apenas a promulgação pelo Congresso, o que deve ocorrer na retomada dos trabalhos legislativos. As regras constitucionais atuais estão em vigor desde a promulgação da Emenda Constitucional 32, em 2001.
A PEC define prazos específicos para cada fase de tramitação das MPs. A comissão mista de deputados e senadores terá 40 dias para votar a proposta. Em seguida, a Câmara dos Deputados terá mais 40 dias. Depois disso, é a vez do Senado, que terá 30 dias para analisar a PEC. Se os senadores apresentarem emendas, os deputados terão mais dez dias para apreciá-las. Nenhum desses prazos poderá ser prorrogado.
Caso o prazo da comissão mista seja descumprido, a MP avançará para a Câmara dos Deputados sem o parecer. Já o descumprimento dos demais prazos significará a perda de validade da medida provisória.
Além disso, fica estabelecido que uma MP entrará em regime de urgência, ganhando prioridade na pauta de votação, a partir do 30º dia de tramitação na Câmara, do 20º dia de tramitação no Senado e durante todo o período de tramitação para revisão na Câmara (se houver).
Pela regra atualmente em vigor, uma MP perde a eficácia se não for convertida em lei em até 120 dias no total, sem definir prazos para a comissão mista e para cada uma das Casas. Um problema desse modelo de tramitação é que todo o tempo pode ser consumido na comissão, sem que os Plenários das duas Casas tenham a oportunidade de analisar a matéria.
Outra medida da PEC é proibir a inclusão nas medidas provisórias dos chamados “jabutis” — dispositivos que não têm relação com o texto mas pegam “carona” na tramitação acelerada das MPs para virarem lei rapidamente. Com as novas regras, passa a ser vedado o acréscimo de matérias estranhas ao objeto original da MP, que não sejam vinculadas a ele “por afinidade, pertinência ou conexão”.
História
A proposta teve origem no Senado ainda em 2011, pelas mãos do então presidente da Casa, José Sarney. Aprovada no mesmo ano, ela ficou parada na Câmara dos Deputados (com o número PEC 70/2011).
Ao longo dos anos, os senadores pressionaram repetidamente para que a PEC fosse votada pelos deputados. O assunto voltava à tona sempre que uma medida provisória chegava ao Senado às vésperas do esgotamento do prazo, obrigando os parlamentares a votar a MP sem análise, apenas para evitar o vencimento.
Em 3 de junho, por exemplo, o Senado fez reunião extraordinária para aprovar as MPs 871/2019 e 872/2019. Se não tivesse havido a votação, as MPs teriam perdido a eficácia no dia seguinte. A MP 871 foi editada para coibir fraudes nos benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Já a MP 872 prorrogou o prazo para pagamento de gratificações a servidores cedidos à Advocacia-Geral da União (AGU).
Após as aprovações nos minutos finais do prazo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, destacou que o diálogo e o entendimento entre os senadores viabilizaram acordo com todos os líderes partidários para a votação da MP do INSS.
— Quero agradecer publicamente a todos os senadores e senadoras que vieram, em uma segunda-feira, exercer o seu mandato parlamentar, representando o povo brasileiro, sabendo da responsabilidade da votação da medida provisória, que interessa ao país — afirmou Davi.
A MP 871 havia sido aprovada pela Câmara dos Deputados poucos dias antes e perderia a eficácia no dia seguinte. Para viabilizar a aprovação da matéria no último dia de sua validade, o presidente do Senado convocou uma sessão deliberativa numa segunda-feira — dia em que as sessões normalmente são destinadas a discursos, sem discussão ou votação de projetos.
A votação do dia 3 foi o estopim para que, no dia 5, a Câmara aprovasse a PEC das MPs, com alterações, e a enviasse de volta para o Senado. A PEC foi aprovada por unanimidade nos dois turnos de votação pelos senadores. No dia 12, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, afirmou que a decisão “ficará na história” do Senado.
— Agradeço o apoio incondicional de todos os senadores e senadoras que ajudaram a construir com esta Presidência a interlocução e o diálogo com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, para a aprovação desta emenda importantíssima — disse Davi na ocasião.
Mas outras MPs acabaram perdendo validade neste ano. As MPs 855 e 856, ambas de 2018, tiveram suas vigências encerradas sem serem apreciadas pelo Plenário da Câmara dos Deputados. Ambas tratavam sobre o setor elétrico.
A MP 873/2019, que impedia o desconto da contribuição sindical em folha, perdeu eficácia recentemente sem sequer ser aprovada na comissão mista. Outra que perdeu a validade este ano foi a MP 854/2018, que acelerava a liberação de recursos para perícias médicas de revisão ou concessão de benefício do INSS. Também não prosperaram as MPs 860/2018 (sobre apoio a refugiados) e 862/2018 (sobre região metropolitana do DF). Outras medidas que deixaram de valer por falta de votação dentro do prazo foram a MP 864/2018 (sobre recursos para intervenção federal em Roraima) e as MPs do Saneamento Básico e da regularização ambiental (MPs 868/2018 e 867/2018).
Com a perda de validade de uma medida provisória, o Congresso Nacional detém a prerrogativa de disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas geradas durante sua vigência. Não havendo a edição de um decreto legislativo no prazo de 60 dias, as relações jurídicas estabelecidas em seu período de vigência conservam-se regidas pela medida provisória.
Novas MPs
Depois que a PEC foi aprovada pelo Congresso, o presidente da República, Jair Bolsonaro, já editou novas medidas provisórias: as MPs 884, 885 e 886 e 887. Todas elas ainda serão votadas pelos congressistas com as regras ainda vigentes, já que a PEC ainda não foi promulgada. Até a promulgação, poderão ser editadas novas MPs, que também serão analisadas com as regras atuais. Somente as medidas editadas após a promulgação terão de ser votadas seguindo os novos prazos aprovados pelo Congresso.
Força de lei
As MPs são normas com força de lei editadas pelo presidente da República em situações de relevância e urgência. Apesar de produzir efeitos jurídicos imediatos, a medida precisa da posterior apreciação pelas duas Casas do Congresso Nacional, Câmara e Senado, para se converter definitivamente em lei ordinária.
Atualmente o prazo inicial de vigência de uma MP é de 60 dias e pode ser prorrogado automaticamente por igual período, caso não tenha sua votação concluída nas duas Casas. Se a medida não for apreciada em até 45 dias, contados da sua publicação, entra em regime de urgência, sobrestando todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando.