Imagina um profissional da saúde ficar seis meses sem receber seu salário? Como fica o psicológico do trabalhador que não consegue pagar suas contas, mas que precisa manter seu emprego? Como lidar com o sustento de sua família mesmo com todas as dificuldades financeiras? Essa triste (e antiga) realidade voltou a ser exposta no plenário da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam), na terça-feira, 21, após o deputado estadual Wilker Barreto (Cidadania) apresentar relatos de profissionais que estão enfrentando graves problemas devido à falta de pagamento de seus vencimentos, que variam de dois a seis meses de atraso.
Diante da tribuna, Wilker exibiu o depoimento de dois enfermeiros, contratados por empresas prestadoras de serviços nas unidades de saúde do Amazonas, e que estão sofrendo com danos financeiros e emocionais, ocasionados pela falta de repasse por parte do Governo do Amazonas às empresas. Ambos tiveram a identidade preservada por meio de represálias, mas que evidenciam a rotina dos mais de milhares de profissionais terceirizados que sofrem da mesma problemática no dia a dia.
Depoimentos
O primeiro depoimento é de um enfermeiro que está há três meses sem receber, fato este que culminou com a interrupção da sua energia elétrica por não pagamento. Para não morrer de fome, o denunciante buscou na venda de latinhas de alumínio uma forma de ganhar dinheiro para se manter.
“O sentimento que eu sinto é de derrota, o aniversário da minha filha foi no dia 12 e da mulher no dia 13, e eu não pude comprar um bolo, sequer um bolo de pote. Já é a segunda vez que cortam a minha energia, tenho que fazer uma ligação com uma extensão pelo corredor (do prédio) para ter pelo menos uma internet e um ventilador. Estar com três meses atrasados e não ter um real para comprar um pão, é inacreditável. Final de semana eu cato latinhas para não faltar alimento”, disse o enfermeiro.
Já uma enfermeira alega que enfrenta diariamente situações vexatórias e que não tem mais a quem pedir ajuda financeira. Além disso, a depoente escancara graves prejuízos com juros de cartões de crédito.
“O meu filho fala ‘Mamãe, porque você vai trabalhar, se você não recebe? Fica em casa’. Ninguém dá satisfação nenhuma e a gente continua trabalhando, continua adoecendo, tem dia que a gente não sabe como vai pagar aluguel, de quem vamos emprestar. Só de cartão de crédito, estou com mais de R$ 20 mil de juros, não tem mais ninguém para emprestar dinheiro com essa quantidade de atraso. Eu tenho um bebê, é leite, fralda, comida, frutas, não pode faltar. Adulto a gente se vira, mas criança não”, relatou.
Atrasos
Wilker detalhou que funcionários terceirizados da Sustentabilidade, Empreendedorismo e Gestão em Saúde do Amazonas (Segeam) que atuam no Melhor em Casa, estão com dois meses sem receber. O último pagamento realizado pelo Governo do Estado para a empresa foi em Março/2023, referente à competência de Janeiro/2023. Já profissionais contratados da Manaós Serviços de Saúde Ltda, que prestam serviços de enfermagem intensiva hospitalar, estão com 4 meses sem receber. O último pagamento realizado pelo Executivo para a empresa foi em Março/2023, referente à competência de Novembro/2022.
Enfermeiros plantonistas da Queiroz Consultoria em Gestão Empresarial Ltda, que prestam serviços na Fundação Centro de Controle de Oncologia do Estado do Amazonas (FCecon), não recebem salários há seis meses. O último pagamento realizado pelo Governo foi em Janeiro/2023, referente à competência de Setembro/2022. E, por último, os enfermeiros intensivistas, contratados pelo IETI – Instituto de Enfermeiros Intensivistas do Amazonas S/S LTDA, e que atuam nas UTIs da rede de saúde do Estado, estão com 3 meses de atraso salarial, sendo o último pagamento repassado pelo Governo foi em Março/2023, referente à competência de Outubro/2022.
Solução
Diante da problemática recorrente, Wilker voltou a sugerir ao Executivo estadual a contratação direta emergencial e a realização de um concurso público para dar fim ao problema de atraso salarial que afeta a Saúde do Amazonas. “A solução eu já estou apontando, vamos fazer um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), chamar o Tribunal de Contas, Ministério Público, acabar com os contratos terceirizados e contratar os profissionais direto, esses profissionais que estão catando latinha podendo fazer um contrato de dois anos, mais dois com a promessa de concurso público. É degradante ver um pai e uma mãe não terem como emprestar dinheiro pra trabalhar, imagina uma enfermeira, uma técnica de enfermagem que tem que cuidar de vários pacientes e não pode cometer um erro, mas na casa dela está com luz atrasada, aluguel atrasado, escola atrasada, ou seja, a vida está uma bagunça”, finalizou Barreto, que também pediu a convocação do secretário estadual de saúde (SES-AM), Anoar Samad, à Casa Legislativa para prestar esclarecimentos acerca do atraso salarial na Saúde do Estado.
Jornalista responsável: Nathália Silveira (92) 98157-3351
Texto: Dayson Valente