“O acesso à justiça é um direito constitucional e a ideia é estarmos, cada dia, mais presentes no interior do Amazonas e de Roraima”.
Com 31 anos de magistratura, a desembargadora Joicilene Jerônimo Portela é a nova corregedora do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR) no biênio 2022/2024. A posse ocorreu no dia 15 de dezembro do ano passado, em sessão solene no Teatro Amazonas. Na bagagem, a magistrada traz a experiência de quem atuou por mais de duas décadas como titular no interior do Amazonas e conhece os desafios de levar justiça aos cidadãos das mais longínquas comunidades amazônicas.
Natural de Tarauacá (AC), é a caçula dos 16 filhos do seringueiro Raimundo Nonato Portela e da dona-de-casa Francisca Marques Jerônimo Portela, ambos já falecidos. Como a família se mudou para Manaus (AM) quando ela tinha apenas 5 anos de idade, guardou poucas lembranças da cidade natal. Divorciada, a desembargadora vivencia a maternidade com seus filhos afetivos, que já lhe deram netos. Quando se casou, seu atual ex-marido tinha seis filhos biológicos e ela conta que se sentiu agraciada por receber uma família completa.
Bacharel em Direito e pós-graduada em Direito Processual Civil, ambos os cursos realizados na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), defende de forma enfática o poder transformador da educação e o papel fundamental da escola pública. Sua trajetória jurídica teve início na advocacia trabalhista (que exerceu por quatro anos) até ingressar na magistratura do TRT da 11ª Região em 17 de dezembro de 1991. Foi juíza titular das Varas do Trabalho de Coari, Tefé, Tabatinga, Manacapuru, Presidente Figueiredo e 4ª Vara do Trabalho de Manaus. Promovida pelo critério de antiguidade, tomou posse como desembargadora em 11 de outubro de 2017.
À frente de várias iniciativas do TRT-11, fala com entusiasmo sobre o Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem, do qual é a gestora regional. A fim de estimular reflexões sobre os malefícios do trabalho precoce e a urgência da implementação de ações de combate à vulnerabilidade social, o comitê que preside no TRT-11 promoveu duas edições do Concurso Cultural e a 1ª Marcha contra o Trabalho Infantil.
Diante dos desafios e incertezas da pandemia da covid-19, coordenou o Gabinete Permanente de Emergência no âmbito do TRT-11 a partir de março de 2020. O trabalho foi fundamental para monitorar e deliberar sobre estratégias e plano de ação visando manter o tribunal em funcionamento de forma remota até o retorno presencial progressivo, preservando a saúde e a vida de todos os envolvidos. Em janeiro de 2021, idealizou a campanha “SOS Amazonas: ajude a salvar vidas” que recebeu apoio de várias instituições e arrecadou recursos para compra de insumos hospitalares e equipamentos de proteção individual doados a hospitais públicos no Amazonas.
No biênio 2020/2022, integrou a Seção Especializada II e presidiu a 2ª Turma. Prestes a iniciar o calendário de correições nas 32 Varas do Trabalho a partir de março deste ano, a corregedora regional fala sobre expectativas e desafios nesta entrevista exclusiva concedida à Coordenadoria de Comunicação Social do TRT-11.
A senhora se empenhou na implementação do programa de aprendizagem no TRT-11, o qual foi formalizado em dezembro de 2022. O que o convênio Aprendiz no Trabalho vai agregar às ações do Comitê do Programa de Combate ao Trabalho Infantil?
A nossa Constituição não autoriza o trabalho à criança e ao adolescente, exceto na condição de aprendiz acima dos 14 anos. Nessa perspectiva de proteção integral dos direitos das crianças e dos adolescentes, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) e o Tribunal Superior da Justiça do Trabalho (TST) criaram o Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizatem. A forma efetiva de combater o trabalho infantil é através da aprendizagem, que constitui uma mudança de paradigma na vida de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
Na medida que temos essa bandeira, é importante darmos exemplo. No serviço público, há duas formas de viabilizar o contrato de aprendizagem: ou os aprendizes são contratados diretamente com recursos oriundos do orçamento ou então através de uma outra modalidade que é a cota social, adotada pelo TRT-11. Em síntese, a cota social é o caminho para aquele empregador que precisa cumprir sua obrigação legal, mas não pode levar o aprendiz para o seu ambiente por uma questão de segurança, como uma empresa de vigilância, por exemplo. Nosso tribunal passou a ser o órgão concedente da prática de aprendizagem. Nós vamos receber aprendizes tanto na sede, nos gabinetes dos desembargadores, quanto nas varas.
A Justiça Itinerante foi impactada pela pandemia da covid-19 e ficou suspensa nos anos de 2020 e 2021, sendo retomada em 2022. Quais são os projetos e desafios para a itinerância neste ano?
O acesso à justiça é um direito constitucional e a ideia é cada dia mais estarmos presentes no interior do Amazonas e de Roraima. O primeiro desafio é o orçamentário, pois a logística que envolve a realização da itinerância exige valores de grande monta. Precisamos obter verba que nos possibilite ir, pelo menos, duas vezes ao ano a cada município do interior dos dois estados de jurisdição. O nosso projeto é que as equipes possam ir uma vez por semestre para tomada de reclamação, realização de audiências e atendimento ao público. Entretanto, só temos verba até junho e estamos em busca de suplementação orçamentária.
O presidente já salientou o objetivo da atual gestão de reconquistar o prêmio CNJ de Qualidade na categoria Diamante. Como o trabalho da Corregedoria pode contribuir para que o TRT-11 volte a figurar entre os tribunais premiados?
Nós apoiamos integralmente o desembargador Audaliphal Hildebrando neste propósito e vamos somar esforços. É necessário fazer um diagnóstico das varas e das unidades administrativas para verificar quais índices podemos melhorar. Acredito que a influência da pandemia tenha ocasionado a não obtenção desse prêmio. Manaus foi duramente atingida em 2020 e 2021. Nós voltamos presencialmente em 2022, ainda de uma forma claudicante, com certa prudência e com medo. Felizmente, isso já está superado, pois temos a vacina e agora vamos buscar o retorno ao que éramos antes, sensibilizando magistrados e servidores para a reconquista do prêmio.
Na sua carreira na magistratura, a senhora atuou por 23 anos como titular de Varas do Trabalho no interior do Amazonas. A última delas foi a Vara do Trabalho de Presidente Figueiredo, na qual permaneceu por 19 anos. Como a vivência de levar justiça ao interior do Amazonas contribui para sua atuação como corregedora?
Eu penso que isso me dá a sensibilidade de entender a realidade das comunidades que vivem no interior e dos juízes que ali atuam. Por vezes, em audiências na itinerância, a parte me dizia: “Nunca estive na presença de uma juíza. Só de estar aqui, diante da senhora, já me sinto mais confiante”. É importante a gente ter essa sensibilidade da importância da presença do magistrado no interior.
A senhora pode adiantar as novidades que pretende implementar em sua gestão?
Ainda é cedo para falarmos em novidades. Primeiro, eu quero compreender o funcionamento da Corregedoria, me colocar a par do que temos e dar continuidade ao trabalho que vem sendo realizado por corregedores que me antecederam. Foram ótimos antecessores, todos empenhados no cumprimento da função institucional da Corregedoria, pessoas dedicadas, cada um com seu desafio naquele momento e com seu modo de trabalhar.
Nosso objetivo é melhorar a cada dia, pois a prestação jurisdicional célere e efetiva é o que todos buscamos. Como nosso presidente, também quero me aproximar da sociedade, do trabalhador, do empresário, dos magistrados e dos servidores. Considero que todos nós somos servidores públicos (em sentido amplo) e precisamos estar cientes disso. Precisamos estar à disposição da sociedade, procurando fazer o melhor possível para atender à confiança que nos foi depositada.
A Corregedoria vai trabalhar para ser vista mais como órgão colaborativo que punitivo?
A Corregedoria tem um papel pedagógico. Nós vamos buscar entender os desafios e orientar para chegarmos à solução do que podemos melhorar. E também estaremos à disposição para encontrarmos meios que possam auxiliar a unidade administrativa ou judiciária a resolver as pendências negativas. Vamos apoiar as iniciativas do tribunal como o trabalho seguro, o combate ao assédio moral e sexual, a inclusão, o respeito à diversidade e outros tantos temas relevantes. A sociedade espera de nós uma atuação proativa e essa justiça social inclusiva é uma bandeira nossa.
O TRT-11 tem um diferencial quanto à representatividade feminina, com maioria de mulheres no 2º grau. A partir da sua trajetória, que mensagem a senhora pode deixar para as meninas e mulheres que sonham em seguir carreira na magistratura?
Acreditem que tudo é possível e que o Sol brilha para todos. Com Deus no coração, que nos mostra o caminho a seguir, nunca deixem de sonhar e nem permitam que ninguém interfira nos seus sonhos. Eu venho de origem humilde, sou mulher num mundo que ainda é machista, mas superei os obstáculos. O importante é acreditarmos que é possível.
Qual mensagem a senhora deixa para os integrantes da magistratura e do corpo funcional, assim como para os jurisdicionados do TRT-11?
Eu quero dizer que a Corregedoria está de portas abertas.Estamos aqui, queremos ouvir e contar com a colaboração e a participação de todos para o engrandecimento do TRT da 11ª Região.
Coordenadoria de Comunicação Social
Texto: Paula Monteiro
Fotos: Acervo TRT-11