Segundo o defensor público Rafael Barbosa, momento é inadequado para a reintegração, em função da pandemia de Covid-19
A Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) ingressou com recurso, nesta quinta-feira (10/09), contra decisão que ordenou a retirada de famílias que moram em área do bairro Flores, conhecida como Beco do Greenvile, em reintegração de posse favorável à Construtora Rayol Ltda. O agravo de instrumento interposto pela instituição pede a imediata suspensão do processo de reintegração, com notificação célere ao juízo de primeiro grau, bem como ao Comando da Polícia Militar do Amazonas, a fim de cessar ação que vise a retirada das famílias do local.
A decisão interlocutória é do Juízo da 3ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho. O recurso foi interposto pela Defensoria Pública de 1ª Instância Especializada em Interesses Coletivos (DPEAIC), que destaca a necessidade de se observar e cumprir as prerrogativas da Defensoria Pública, como intimação pessoal de seus membros em todos os atos do processo, inclusive com vista, e a contagem em dobro dos prazos processuais, nos termos do artigo 128 da Lei Complementar nº 80/1994. O documento também pede a intimação do Ministério Público do Amazonas (MPE-AM), que demonstrou interesse na causa e, inclusive, interpôs Recurso Especial e Extraordinário sobre o tema.
De acordo com o defensor Rafael Barbosa, da Defensoria Pública Especializada em Interesses Coletivos, o momento é inadequado para a reintegração, em função da pandemia de Covid-19 e da vigência do estado de emergência em saúde pública no Amazonas. Segundo ele, inúmeras entidades recomendaram a suspensão de mandados coletivos de reintegração de posse, em respeito aos direitos fundamentais dos mais vulneráveis e para a contenção de danos pela disseminação do Covid-19.
“A efetivação da reintegração de posse nesse momento coloca em risco a saúde dos profissionais envolvidos no cumprimento da ordem e dos próprios ocupantes, indo na contramão dos objetivos traçados pelo próprio Agravante para proteger a sua população. O direito à vida e à saúde se sobrepõem ao direito de propriedade. É impossível deixar de destacar que, se concretizada, a remoção ocorrerá em meio a pior crise sanitária vivenciada nos últimos cem anos, decorrente da pandemia do novo coronavírus”, diz o defensor, no recurso.
Ele complementa que a remoção impedirá que as famílias possam obedecer às medidas necessárias de isolamento social, agravando a situação de vulnerabilidade social em que já se encontram.
“A Defensoria Pública do Estado do Amazonas não pode deixar de sublinhar que o direito fundamental à moradia, à vida e à saúde, notadamente nos tempos em que o comando das autoridades médicas e sanitárias é o de isolamento social, devem se sobrepor à posse e patrimônio, pois a moradia digna está, umbilicalmente, ligada ao exercício da cidadania, um dos pilares da República”.
Sobre o caso – As famílias moram na área localizada na rua F, conjunto Jardim Amazonas, bairro Flores, desde 2007, e já sofreram tentativas de retirada da área. Na manhã de quinta-feira, foram surpreendidos com a decisão que determina a reintegração imediata. Até 2013, as famílias eram defendidas por um advogado do Escritório Modelo da Faculdade Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (Ciesa), que renunciou ao mandato no curso do processo e, a partir desse momento, as famílias ficaram sem defesa técnica.
Em fevereiro de 2014, já com o trânsito em julgado da sentença, a Defensoria Pública passou a atender as famílias, ocasião em que o defensor público responsável moveu Ação Rescisória no Tribunal de Justiça do Amazonas, com o objetivo de rescindir a sentença proferida de reintegração. Com esforço, a Defensoria Pública conseguiu suspender o cumprimento da ordem de reintegração, na época.
Ontem (10/09), sem ter sido intimada, a Defensoria tomou conhecimento da decisão para reintegração pela imprensa e pelos moradores da área. A instituição aguarda a apreciação do agravo.