Por Sebastião Oliveira Equipe Ascom Ufam
É o que afirma o professor da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Amazonas e autor do livro Amazonês, Sérgio Freire, que traduziu a palavra comum à pandemia, lockdown, que quer dizer sossega-facho.
O docente conta que a tradução mais dicionarizada de lockdown seria “confinamento total”. Mas, segundo ele, “sossega-facho foi uma forma lúdica de chamar a atenção de que às vezes precisamos ser mais diretos para comunicar e nada mais direto do que a oralidade”. O docente exemplifica de como podemos transitar o significado das palavras quando diz: “Governo vai decretar o sossega-facho geral para conter o aumento do contágio”. São as possibilidades da língua que nos permitem brincar com os sentidos, completou.
Daqui para frente, o amazonense irá se adaptará a nova maneira de se comunicar. Para Sérgio Freire, “o senhor soberano da língua é o falante. Ele faz dela o que bem entender. As palavras estrangeiras serão sempre bem-vindas porque bem-vindo também é o contato cultural com outras culturas, outros povos. E as derivas são super importantes também. Logo, logo, teremos crianças batizadas com o nome de Lockdown, por exemplo”, disse o docente que humoriza, “Nome? Lockdown dos Santos Souza. Se for essa a vontade do falante, ninguém segura. Por isso a língua é tão bonita”.
O simples fato da sociedade absorver palavras estrangeiras tem efeito imediato na comunicação. Palavras como: lockdown, refill, delivery, como tantas outras que já fazem parte do nosso cotidiano. “Além da questão das línguas em geral, há questões específicas de cada área. Por exemplo, no comércio, palavras como delivery, tem um apelo maior do que disk-entrega. É mais apelativo para o consumidor entrar numa loja cuja vitrine diz que os preços estão 50% off do que numa que tem escrito na vitrine Liquidação de 50%. No ramo imobiliário, as pessoas preferem morar no prédio Maison de Paris do que no Morada do Jaraqui, embora possam ser prédios idênticos. Há uma economia nas trocas linguísticas e nós, linguistas, estudamos e tentamos entender por que essas coisas acontecem. As línguas estão em contato, em movimento, e isso é bom”, completou.
Sérgio Freire entende que a língua é uma característica sócio-histórica do ser humano. Ele afirma que “ela vai se moldando para acolher as mudanças dos fatos e da realidade. Por isso, novas palavras e expressões surgem, outras caem em desuso. Numa pandemia, que como o próprio nome diz é geral, os fatos e expressões que fazem parte desse universo vêm num pacote”, disse.
“A língua portuguesa empresta essas palavras, enquanto se organiza para, se for o caso, incorporá-la ao léxico do idioma. Foi o que aconteceu com futebol (football), com abajur (abat-jour) e outras. O português empresta, mas, se ficar, fica do seu jeito. Mouse, por exemplo, que veio junto com a cultura da informática, ficou. Mas o plural em português é mouses e não mice, como em inglês. Não é preciso se preocupar com os empréstimos. Eles não ameaçam a língua. Ninguém pede emprestado o que não precisa”, finalizou.