Até o dia 18 de novembro, a empresa Potássio do Brasil deverá apresentar projeto de empreendimento que envolve atividades de extração mineral detalhando os possíveis impactos aos modos de vida do povo indígena Mura, em Autazes (a 113 quilômetros de Manaus) e Careiro da Várzea (a 25 quilômetros da capital), em cumprimento ao protocolo de consulta construído pelos indígenas como parte de acordo judicial. As tratativas são conduzidas no âmbito de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF).
O prazo de 30 dias foi definido em audiência realizada na última quinta-feira (17), no auditório da Justiça Federal do Amazonas, em Manaus, com a participação de cerca de 60 indígenas, do MPF, de representante da empresa e órgãos públicos estaduais e federais competentes.
O projeto deverá conter, de forma clara e objetiva, em linguagem simples, informações sobre a extensão do empreendimento, o que será extraído e explorado, possíveis impactos sobre recursos naturais, medidas para mitigação dos danos, dentre outras questões. O relatório será entregue às instâncias representativas do povo Mura, instituídas no protocolo de consulta: o Conselho Indígena Mura (CIM) e a Organização de Lideranças Indígenas Mura de Careiro da Várzea (OLIMCV).
Na ocasião, a Justiça Federal determinou que a empresa custeie a assembleia que será realizada pelo povo indígena para discutir o projeto, bem como a contratação de especialistas escolhidos pelos Mura para auxiliá-los na análise. A Justiça ainda definiu que as lideranças indígenas deverão apresentar orçamento, no prazo de 60 dias, com as despesas necessárias para a realização da assembleia e contratação dos especialistas.
Outro encaminhamento resultante da audiência foi trazido pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE). O órgão, que representa o poder Executivo estadual, anunciou que o Estado irá conceder ao povo Mura a Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) coletivo para territórios tradicionais ainda não demarcados localizados em terras do estado do Amazonas, como forma de garantir segurança fundiária e jurídica na região, reconhecendo o direito dos povos originários.
A empresa Potássio do Brasil reafirmou, durante a audiência, o compromisso de respeito ao protocolo de consulta do povo Mura, bem como às decisões tomadas por eles no âmbito da consulta, nos moldes da Convenção nº 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Veja a íntegra do protocolo de consulta, elaborado pelo povo indígena Mura.
Ao fim da audiência, também ficou decidido que a Prefeitura de Autazes será notificada sobre a necessidade de retirada de placa localizada na cidade que, segundo os indígenas, refere-se ao município como “terra do potássio”, devido ao caráter de propaganda espontânea para o empreendimento da empresa Potássio do Brasil. Representantes do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), da Agência Nacional de Mineração (ANM) e da Fundação Nacional do Índio (Funai) também estiveram presentes na audiência.
Entenda o caso – O MPF passou a acompanhar o caso depois de receber informações de que a empresa Potássio do Brasil Ltda. começou a realizar estudos e procedimentos na região sem qualquer consulta às comunidades. Em julho de 2016, o órgão expediu recomendação ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), para que cancelasse a licença já expedida, e à Potássio do Brasil, para que suspendesse as atividades de pesquisa na região até a realização das consultas nos moldes previstos na legislação. Nenhum dos pedidos foi atendido. A concordância em realizar as consultas nos moldes previstos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) só veio após o MPF levar o caso à Justiça, por meio da ação nº 19192-92.2016.4.01.3200.
A apuração que resultou na ação do MPF constatou que, desde 2009, vinham sendo realizadas pesquisas de campo, autorizadas pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), para a identificação das jazidas dentro da terra indígena Jauary, sem que fossem consultadas as comunidades potencialmente atingidas. O estudo de impacto ambiental do empreendimento classificou o porte de empreendimento como “excepcional” e afirma ser “muito alta” a interferência nos referenciais socioespaciais e culturais nas comunidades tradicionais e indígenas da região.