A total ausência de esforços para cumprir as obrigações assumidas em Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) do programa Carne Legal levou o Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas a requerer na Justiça a execução de multa no valor de R$ 3.885.750,00 ao frigorífico Amazona, que assinou originalmente o acordo, e a seus arrendatários sucessores – Frigoli Alimentos e Frigonosso. Essa é a primeira ação do MPF para exigir o pagamento de multa por descumprimento dos acordos do programa Carne Legal.
Passados mais de cinco anos da assinatura do TAC, o MPF verificou que não houve qualquer esforço por parte dos frigoríficos para cumprir as obrigações assumidas. Para o órgão, todas as empresas – tanto as sucessoras como a sucedida – são corresponsáveis pelo acordo assinado.
Investigações concluíram que houve compra de gado de propriedades onde ocorreu desmatamento ilegal. Verificou-se ainda, entre outros itens previstos no TAC, a ausência de manual de procedimentos e de envio semestral da lista de fornecedores credenciados e descredenciados pelas empresas.
Diante da repetida ausência de respostas aos requerimentos do MPF, o órgão requereu auditoria nas compras da empresa e verificou que foram adquiridos, em 2017, pelo menos 471 animais oriundos de propriedades que praticaram desmatamento ilegal, segundo cruzamento de dados realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), validados pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam). A multa é calculada com base nesse montante de animais com procedência irregular adquiridos pelas empresas que assinaram o acordo do Carne Legal.
A ação de execução de multa explica que a empresa Frigorífico Amazona informou ao MPF ter firmado contrato de arrendamento com a empresa Frigoli Alimentos, com vigência até novembro de 2015. A quinta cláusula do contrato prevê que o arrendatário ficaria obrigado a satisfazer todas as exigências dos poderes públicos. No entanto, a empresa Frigoli Alimentos informou, em agosto de 2017, que desconhecia os termos do acordo e requereu a renovação do prazo para que pudesse se adequar e cumprir as cláusulas do acordo, o que não ocorreu.
De acordo com a Agência de Defesa Agropecuária e Florestal do Estado do Amazonas (Adaf), o frigorífico Frigonosso atualmente opera o estabelecimento comercial. Por isso também foi incluída entre os alvos da ação de execução.
A ação tramita na 7ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amazonas, sob o número 1010141-35.2019.4.01.3200, e aguarda decisão da Justiça em relação ao pedido de execução da multa às empresas.
Programa Carne Legal – Desde 2009, o MPF atua para a regularização da cadeia produtiva da pecuária no Amazonas por meio do programa Carne Legal. Entre 2013 e 2018, foram celebrados acordos com os maiores frigoríficos do Amazonas a partir dos diálogos fomentados pelo programa. O acompanhamento do cumprimento dos acordos é feito pelo MPF por meio de procedimentos administrativos.
Os frigoríficos que assinaram os TACs se comprometeram a comprar matéria-prima apenas de produtores rurais que não cometam desmatamento ilegal, que tenham suas propriedades identificadas por meio de inscrição no Cadastro Ambiental Rural, iniciem o processo de licenciamento ambiental e não tenham ocorrência de trabalho escravo, invasão de unidades de conservação, terras indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, e devem enviar ao MPF, a cada seis meses, a lista de fornecedores credenciados e também dos que foram descredenciados em função das exigências previstas no acordo.
Em caso de descumprimento, o acordo prevê multa correspondente a 50 vezes o valor da arroba de boi gordo, baseado no índice da BM&F-Bovespa, por cabeça de gado adquirida fora dos padrões estabelecidos pelo termo.
Os resultados do programa Carne Legal foram apresentados pelo MPF em 2017, durante evento promovido pelo governo norueguês para discutir soluções estratégicas para o desmatamento de florestas tropicais. De acordo com relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU), o programa representa um dos maiores processos de redução da emissão de gases que provocam o efeito estufa, bem como um grande avanço na preservação ambiental. Conforme levantamento feito pela Union of Concerned Scientists, apresentado no evento, a atuação do MPF contribuiu para uma redução superior a 60% do desmatamento ilegal da Floresta Amazônica.