Alunos e professores participaram, na manhã de hoje (20), em São Paulo, de encontro com o escritor moçambicano Mia Couto, convidado especial da edição do Programa Educativo Escola, Museu e Território e do Programa Prazer em Ler, do Itaú Cultural, em parceria com a Fundação Roberto Marinho. O evento, promovido pelo Museu da Língua Portuguesa, ocorreu na Escola Técnica Estadual Centro Paula Souza Santa Ifigênia, no centro da capital paulista.
Autor de mais de 30 livros, Mia Couto foi agraciado com diversas premiações, entre elas, o Prêmio Camões (2013) e o Neustadt Prize (2014). Seu romance Terra Sonâmbula é considerado um dos dez melhores livros africanos do século 20. Antes do encontro, os alunos trabalharam em sala de aula alguns títulos de Mia Couto, como O Fio das Miçangas e Poemas Escolhidos.
Acostumado com plateias de estudantes, o autor moçambicano disse que a escrita, para ele, significa estar junto a outras pessoas e que o “estar junto em volta das histórias e dos livros é quase um ato político”. “Vivi em um regime de ditadura e, quando entrei na universidade, era proibido haver grupos. Então, desfrutar juntos qualquer coisa, simplesmente conversar e ter o direito da troca de ideias já é uma maneira de dizer que estamos aqui”, ressaltou o escritor.
Mia Couto revelou que encontrou na escrita uma forma de se aproximar das pessoas e, ao mesmo tempo, conhecer sua própria existência. “Eu era visto, olhado e tocado, porque liam meus escritos e eu dizia coisas. Meu pai era poeta, ele tinha a preocupação de que eu tivesse essa porta aberta e que pudesse me tornar um intelectual. Esse desejo, de fazer uma viagem, de chegar até o outro, é o que me move até hoje para escrever.”
Biólogo de formação, quando questionado por uma aluna sobre o meio ambiente, Mia Couto disse que a questão “não é apenas ambiental, mas também política”. Para ele, os assuntos ambientais ficaram reduzidos a ambientes restritos, quando deveriam ter uma dimensão vista em seu conjunto. “Os biólogos e ecologistas têm que ter esse cuidado para não se restringirem. É o problema da água, é o problema ambiental. Mas tudo tem a ver com todo o resto e com a maneira como os recursos são pensados e usados, ou mal usados. Isso tem a ver com a economia, empresas, política. É preciso mudar muito para que as coisas no meio ambiente possam mudar”, afirmou.
Programa educativo
Na oportunidade, a gerente de Projetos da Fundação Roberto Marinho, Deca Farroco, ressaltou que o que se quer é retomar as conexões do Museu da Língua Portuguesa com as imediações onde está localizado, no centro da cidade. A atividade do Programa Educativo Escola, Museu e Território é feita a cada 15 dias, para pessoas de várias faixas etárias. Desta vez, a organização aproveitou que o autor estava no país e o convidou a participar.
“Sempre que o Mia Couto vem ao Brasil, ele faz questão de falar com os estudantes. Mia já é um escritor superconsagrado, lançado no Brasil há bastante tempo, e esse intercâmbio só nos faz retomar algumas coisas que temos do nosso nascedouro como nação e nos reconhecemos nessas falas e expressões. Mas também ampliamos e redescobrimos esses países.”
A coordenadora da área de Letras e Números do Itaú Cultural, Diane Melo, disse que trabalha com a literatura como um ponto fundamental para a formação de crianças e jovens. “Então, dar aos alunos e professores a oportunidade de conversar com um autor renomado é ressignificar o papel da literatura. O leitor, ao encontrar com o escritor, também ressignifica sua própria vida”, ressaltou.
“Essa é a potência da literatura. Acreditamos muito nesse intercâmbio entre autores, literatura e mediador. Os alunos que estão aqui talvez nem conhecessem o Mia Couto. A partir de um professor que traz o autor para dentro da sala de aula, isso desperta os alunos para outras obras, outros autores, ajudando na contrução da própria identidade”, disse Diane.
Para a educadora social da rede de bibliotecas comunitárias LiteraSampa Val Rocha, encontros como este são de grande riqueza e abrem o leque sobre a interpretação do que se lê. “Este é o nosso terceiro encontro com Mia Couto. É muito importante conhecer a literatura. Poder trocar com quem escreveu nos estimula e nos instiga a escrever. Estar com o autor e outras pessoas, conversando sobre literatura, nos faz pensar sobre nossa escrita”, afirmou.
A aluna Kauanny Isabele Dias Santos, 15 anos, leu um livro do autor pela primeira vez há alguns dias, quando o professor levou uma das obras para a turma. Ao ler O Fio das Miçangas, Kauanny se sentiu provocada a conhecer outros livros de Mia Couto. “É uma obra interessante, que prende. São muitas histórias, que têm no personagem principal uma mulher, e a história central se conecta com as outras, tendo partes dela em outras. São situações que podem acontecer”, destacou a estudante.
Edição: Maria Claudia