Meio Ambiente
9 de Setembro de 2019 às 13h45
MPF sobrevoa Parque Nacional do Iguaçu e constata regeneração da floresta na Estrada do Colono
Projeto de lei pleiteia a reabertura da estrada, o que para o MPF representaria prejuízo para Unidade de Conservação
Arte: Ascom MPF/PR
O Ministério Público Federal (MPF) em Foz do Iguaçu/PR realizou, na última semana, sobrevoo de helicóptero no Parque Nacional do Iguaçu e constatou a regeneração total da vegetação na área do leito da antiga Estrada do Colono. A diligência foi realizada para instruir um inquérito civil que apura a possibilidade de reabertura da rodovia no interior do parque, entre os municípios de Serranópolis do Iguaçu e Capanema.
Projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados prevê a reabertura da estrada, sob a justificativa de restaurar as relações socioeconômicas e turísticas nas regiões Oeste e Sudoeste do Paraná, mas, para o MPF, isso representaria grave risco para a Unidade de Conservação.
Durante o sobrevoo, o comandante da aeronave da Polícia Rodoviária Federal teve dificuldade de localizar a área da antiga estrada, devido ao completo estado de regeneração da floresta. O antigo leito da estrada já desapareceu sob a vegetação, razão pela qual sua localização só foi possível por meio das coordenadas geográficas com uso de GPS.
A procuradora da República Daniela Caselani Sitta e o técnico de segurança institucional do MPF, Jean Matheus Tessari Wagner, observaram que da antiga estrada resta apenas uma “cicatriz” em meio à floresta, ou seja, um discreto “risco” em alguns pontos onde a mata regenerada no antigo leito ainda é mais baixa.
De acordo com o que foi apurado pelo MPF, a reabertura da estrada exigiria um desmatamento de 20 hectares dentro do Parque Nacional do Iguaçu, área que se regenerou nos últimos 16 anos, desde o fechamento definitivo da Estada do Colono por uma decisão judicial.
Além do desmatamento, a reabertura da estrada provocará os seguintes danos ambientais: a “ruptura” do ecossistema, com o consequente isolamento de animais, pois algumas espécies não atravessam áreas desmatadas; erosão e assoreamento de cursos d’água; o chamado “efeito de borda”, que consiste na alteração nas condições microclimáticas (temperatura, umidade, insolação, vento etc.) e produz grande desequilíbrio no bioma como um todo; morte de animais por atropelamento; difusão de doenças e contaminação biológica devido ao tráfego de veículos e de pessoas; risco de degradação ambiental por acidentes de trânsito dentro do Parque, com o consequente vazamento de combustível; a facilitação da presença de pescadores, caçadores e palmiteiros.
Decisão judicial – Esses impactos ambientais já estão demonstrados há anos, desde que a estrada foi fechada por força de decisão judicial na Ação Civil Pública nº 00.00.86736-5/PR, ajuizada pelo MPF perante a Justiça Federal em Curitiba. A sentença, proferida em 19 de outubro de 2017 pela juíza federal Pepita Durski Tramontini Mazini, baseou-se num extenso laudo pericial, que provou os danos ambientais provocados ao Parque Nacional do Iguaçu pela Estrada do Colono.
Trecho da sentença indica que a perícia realizada na época constatou que “os efeitos de uma estrada não se resumem unicamente à cicatriz deixada na mata caracterizada pela metragem da largura desta. Os efeitos se estendem para dentro da mata que margeia essa estrada, por um processo denominado ‘efeito de borda’. Ao cortar um trecho de mata, cria-se uma borda, ou seja, uma região de contato entre a área desmatada e o fragmento de floresta restante. Essa borda sofre rapidamente uma modificação na sua composição, uma vez que o aporte de luz, vento, umidade e condições climáticas, de um modo geral, são totalmente alterados. Com a alteração do clima nas bordas, as espécies vegetais marginais à estrada, mudam completamente e, da mesma forma, aumenta-se os casos de predação, herbivoria, parasitismo, dispersão e polinização. Com a mudança na vegetação, altera-se também a abundância e a composição da fauna ali presente”.
A decisão judicial ainda ressalta que “quando a estrada estava aberta, a passagem de veículos representava, certamente, uma ameaça à fauna, que se arriscava a atravessar de um lado para outro, ocorrendo atropelamentos de fauna, que são inevitáveis em áreas onde estradas cortam locais com alta biodiversidade. Além disso, nos períodos de seca, o trânsito de veículos em uma estrada não pavimentada provoca a elevação de partículas, produzindo nuvens de poeira, que se depositam sobre as folhas das plantas da borda da floresta, causando o sufocamento das espécies menos resistentes e menos adaptáveis a este tipo de ambiente”.
Ao verificar o mapa da região, enxerga-se que a antiga via ligando os municípios de Serranópolis do Iguaçu e Capanema, numa extensão de 18 km, dividia o parque na sua “Zona Intangível”, que é reservada à proteção integral do ecossistema. Nesse cenário, destaca a procuradora da República, “a Estrada do Colono era uma ferida aberta no coração do Parque Nacional do Iguaçu, que já cicatrizou, e um novo ‘corte’ ameaça órgão vital da Unidade de Conservação”.
Estrada-parque – O objetivo do projeto de lei é criar no antigo leito da via a Estrada-Parque Caminho do Colono, por meio da alteração da Lei nº 9.985/2000, prevendo uma nova modalidade de Unidade de Conservação na categoria “estrada-parque”.
Atualmente, na legislação brasileira não existe a previsão de Unidade do tipo “estrada-parque”. Esta previsão pode ser enquadrada na categoria Área de Proteção Ambiental (APA), cujo enfoque principal é a exploração econômica com critérios para garantir a sustentabilidade ambiental.
Essa categoria é incompatível com o grupo em que enquadra o Parque Nacional do Iguaçu – Proteção Integral – cujo objetivo básico é preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais.
Nesse sentido, a sentença proferida em 2017, que determinou o fechamento da Estrada do Colono, afastou a possibilidade da transformação da via em uma “estrada-parque”, com base na perícia realizada na Ação Civil Pública. A perícia apresentada à época ressaltou que a abertura da estrada não se justificava pelo progresso econômico, ao contrário, sua importância econômica seria muito restrita.
Desta forma, o MPF reforça que não existe a possibilidade de uma estrada ser ecológica, e a criação da “Estrada-Parque Caminho do Colono” terá como consequência a perda de parte do território do Parque Nacional do Iguaçu, o que representa um grande retrocesso na preservação do meio ambiente.
Íntegra da sentença que determinou o fechamento da Estrada do Colono (Nº 00.00.86736-5/PR)
Relatório de Diligências do sobrevoo realizado pelo MPF
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