Representantes de entidades dos trabalhadores ouvidos na tarde desta quarta-feira (21) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) avaliaram que a proposta de reforma da Previdência (PEC 6/2019) é prejudicial ao trabalhador privado e ao servidor público. Foram quatro mesas de debate, em quase cinco horas de audiência, que foi sugerida pelos senadores Humberto Costa (PT-PE) e Paulo Paim (PT-RS). Plano de inclusão, regras para o benefício de prestação continuada (BPC), critérios para os servidores públicos e fontes de financiamento foram alguns dos temas debatidos.
O debate fez parte de um ciclo de audiências que a CCJ está promovendo sobre o assunto. Pela manhã, a comissão já havia realizado uma audiência em que a proposta do governo também foi muito criticada. O tema está em análise na comissão e depois será enviado ao Plenário. A previsão é que a tramitação da reforma seja concluída no início de outubro.
Consultor Legislativo do Senado, Luiz Alberto dos Santos disse que o tema da reforma é complexo e apontou problemas no texto da PEC. Segundo ele, a proposta contém previsões “inconsistentes e até mesmo inconstitucionais”. Santos cobrou a reforma dos militares, que seria um dos principais problemas previdenciários do país, e apontou que a PEC pode trazer insegurança jurídica, ao retirar regras previdenciárias da Constituição.
Para o consultor, as novas regras prejudicam os mais pobres, que receberão menos em caso de pensão por morte, invalidez e outras situações. A reforma também prejudicaria os servidores públicos, que em alguns casos, por conta das regras que somam tempo de contribuição e idade, terão de trabalhar até os 70 anos ou terem 43 anos de contribuição.
— Estamos em uma corrida de obstáculos com obstáculos móveis. [A reforma] certamente vai gerar uma judicialização em muitas questões — avaliou.
O presidente da Associação dos Funcionários do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), José Celso Pereira Cardoso Junior, classificou como mito a ideia de que o estado brasileiro é muito grande. Ele disse que o número de servidores é praticamente o mesmo desde a promulgação da Constituição, em 1988, e que existem carências específicas de funcionários em algumas áreas. Cardoso Junior também criticou a ideia de acabar com a estabilidade do servidor (PLS 116/2017) e as novas regras de previdência.
— Essa reforma pode, na verdade, entregar estagnação e colapso social — alertou.
Miséria
Para o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Carlos Fernando da Silva Filho, a reforma proposta pelo governo retira direitos previdenciários. Ele destacou que mudanças recentes na legislação trabalhista, como o trabalho intermitente e a terceirização irrestrita, comprometem o financiamento dos recursos da Previdência.
Segundo o presidente do Sinait, a reforma da Previdência deveria ser discutida em harmonia com outras pautas, como a saúde do trabalhador e a qualidade de vida. Na visão de Silva Filho, a reforma é uma maneira de o governo “largar o trabalhador no completo desamparo”.
— Temos alterações que modificam formas de acesso, benefícios e cálculo. Alguns trabalhadores ficam em exposição ao risco. Assim, precisamos ouvir os argumentos técnicos, e não apenas políticos ou fiscais — argumentou.
A secretária-geral da Central do Servidor (Pública), Silvia Helena de Alencar Felismino, afirmou que a reforma é cruel com os pensionistas e joga milhões de brasileiros na miséria. Ela cobrou uma reforma tributária mais simples e mais justa e disse ter certeza de que o Senado vai fazer uma reflexão sobre o texto aprovado na Câmara, para o bem do trabalhador e do país.
Equilíbrio
O senador Flávio Arns (Rede-PR) disse que a reforma do jeito que está pode comprometer o planejamento dos trabalhadores brasileiros e ser classificada como “uma apropriação indébita”.
— Acho que existe o consenso de que uma reforma tem que acontecer. Como a gente faz isso é a grande questão. Não podemos frustrar todo o planejamento que as pessoas construíram — argumentou Arns.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) afirmou que as preocupações apresentadas pelos debatedores têm muita consistência e pertinência. Ele disse que a retirada de recursos que circulam no consumo pode comprometer a economia do dia a dia. Para o senador, o texto não pode passar sem ajustes e é preciso encontrar um caminho para a “redução de danos”.
Relator da reforma, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) admitiu que tem o difícil papel de ajustar a questão fiscal com as demandas apresentadas. Segundo ele, o deficit da Previdência é um fato e compromete os investimentos públicos. O relator acrescentou que anotou as sugestões e vai trabalhar no tema buscando o equilíbrio.
— Se tivermos que corrigir, a base da correção será de baixo para cima, dos mais vulneráveis para os de cima da pirâmide — prometeu Tasso.
Os senadores Paulo Rocha (PT-PA), Jaques Wagner (PT-BA) e Zenaide Maia (Pros-RN) também acompanharam a audiência pública.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)