08/08/19 14h15
Portos e NaviosO prolongamento da guerra comercial entre Estados Unidos e China abre espaço para que o Brasil tente aumentar a participação de suas exportações aos dois países, afirma estudo inédito da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
O ganho de mercado ocorreria sobretudo nas vendas externas de produtos básicos para a China, onde Brasil e Estados Unidos disputam diretamente a preferência dos compradores chineses e a competitividade brasileira tende a aumentar a partir de agora por causa da taxação de seus correspondentes americanos.
“Esses produtos commoditizados têm um preço internacional, e as margens de lucro são muito pequenas. Quando a China coloca uma tarifa de 10% ou 20%, a importação a partir dos EUA fica muito cara”, afirma Welber Barral, diretor do departamento de relações internacionais e comércio exterior da Fiesp e sócio da consultoria Barral M. Jorge.
Já o ganho de participação no mercado americano deve ser mais difícil de ser concretizado. “O mercado americano é mais pulverizado, são outros países que acabam sendo mais competitivos do que o Brasil”, afirma.
Barral lembra que cerca de 50% da pauta exportadora brasileira aos EUA é formada por produtos industriais, em que o Brasil tem, tradicionalmente, maior dificuldade para competir com seus pares estrangeiros.
O estudo identificou 23 produtos exportados à China e 33 aos Estados Unidos com potencial para abocanhar uma fatia maior nestes mercados.
Para chegar à lista final, o produto precisava atender a dois critérios simultâneos: ter apresentado aumento nas exportações no primeiro semestre e ter sofrido sobretaxação por causa da guerra comercial sino-americana. Também era requisito que o item tivesse somado, entre 2016 e 2018, média mensal de ao menos US$ 1 milhão de exportações para uma das duas localidades.
Nas vendas brasileiras para a China, por exemplo, o minério de cobre, com 134 mil toneladas líquidas exportadas, é um dos destaques, com alta de quase 140% no volume vendido no primeiro semestre em relação ao mesmo período do ano passado. O restante da lista é dominado por produtos básicos ou apenas semielaborados.
Para Barral, a possibilidade de incrementar o comércio exterior é concreta dada a escalada das tensões entre os dois países. “A guerra comercial está se estendendo muito além do que se esperava. Em vários momentos houve alguma expectativa de que se chegaria a um acordo, mas a China protelou a negociação e o presidente americano, Donald Trump, irritou-se”, afirma.
Na semana passada, os Estados Unidos anunciaram tarifa adicional de 10% sobre US$ 300 bilhões em bens importados da China. No domingo, o banco central da China (PBoC) anunciou que deixaria o yuan cair para a cotação de 7 por dólar, levantando temores sobre avanço da disputa para uma guerra cambial.
Apesar da trégua de ontem, os analistas veem os últimos acontecimentos como sinais claros de que o desfecho para a questão será complexo, diferentemente do projetado há alguns meses.
Mesmo com a chance de maior penetração dos produtos brasileiros, Barral pondera que os potenciais estragos da guerra comercial não são desprezíveis. “Sabemos que existe um grande efeito internacional que é ruim para todos, como a queda das bolsas de valores e a insegurança no comércio internacional como um todo”, afirma.
Por essa linha de raciocínio, ele também explica que o cenário para o exportador não deixa de ser desafiador. “Pode existir a oportunidade de se desenvolver novos canais de distribuição. Mas, por outro lado, a disputa pode se reverter com os dois países entrando em acordo”, diz.
Embora sinalize possíveis caminhos para a expansão do comércio exterior brasileiro, o estudo da Fiesp adota ressalvas ao atrelar o desempenho dos produtos brasileiros nos seis primeiros meses deste ano a um ganho consistente de mercado.
“É preciso considerar que o aumento das exportações brasileiras a ambos os países está sujeito à influência de outras variáveis, incluindo estratégias corporativas – não só de produtores brasileiros, mas também de multinacionais que buscam adequar-se globalmente às novas condições comerciais”, traz o estudo.
O levantamento ainda explica que o período de análise é muito curto para traçar uma tendência, uma vez que a maior parte das sobretaxas está em vigor há menos de 12 meses.
Até junho, a escalada das restrições comerciais entre as duas nações envolvia um total de 12.884 linhas tarifárias, com 6.866 itens afetados pela sobretaxa aplicada pelos americanos e 6.018 produtos afetados pelas retaliações chinesas. A disputa concentra-se em máquinas e equipamentos (17,6%), produtos químicos (8,2%) e produtos farmacêuticos (3,5%).