O Museu Nacional do Rio pretende firmar parcerias com instituições públicas e privadas para reconstruir o prédio histórico e fortalecer a governança, com a meta de reabrir uma parte do palácio com exposições para festejar o bicentenário da independência do Brasil, em 2022. A informação é da reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denise Pires de Carvalho.
“Estamos iniciando o projeto Museu Nacional Vive, com esse novo modelo de governança, que pretende atrair novos parceiros visando, em 2022, podermos inaugurar pelo menos uma parte do palácio com exposições que vão festejar o bicentenário da independência brasileira”, afirmou a reitora.
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Em 2 de setembro de 2018, um incêndio destruiu o Museu Nacional, prédio histórico onde morou a família imperial, no parque da Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão, zona norte do Rio de Janeiro. O museu tinha um dos acervos mais importantes do país com cerca de 20 milhões de peças.
Segundo a reitora, no próximo ano, serão reinauguradas as áreas administrativa e acadêmica do museu, com a construção do Campus da Cavalariça.
De acordo com o diretor do Museu Nacional, Alexander Kellner, o novo campus será construído no terreno de 44 mil metros quadrado, pertencente à União, que já foi destinado para o museu, faltando apenas alguns detalhes burocráticos para consolidar a doação.
“Nós precisamos pensar na reconstrução da estrutura física dos laboratórios que nós perdemos. Este terreno vai ser o futuro Campus Cavalariça. O governo brasileiro cedeu esse terreno, estamos só acertando detalhes finais. Queremos construir ali inclusive um centro cultural educacional, mas ainda não temos verba. Quando conseguir essa verba, ele pode ser construído em seis, no máximo, nove meses”.
A reitora afirmou ainda que já iniciou os primeiros processos de licitação do projeto do Campus da Cavalariça, como o cercamento do terreno e a infraestrutura básica para o novo prédio. De acordo com Denise, as obras para a construção dos laboratórios e da parte administrativa devem começar ainda este ano, com a destinação de parte da verba da emenda impositiva da bancada fluminense, que já está disponível para a universidade.
“O valor disponível hoje é de R$ 68 milhões, sendo R$ 43 milhões destinados pela emenda impositiva da bancada do Rio de Janeiro na Câmara dos Deputados, R$ 21 milhões de um convênio com o BNDES e outros R$ 5 milhões repassados pelo Ministério da Educação que estão sendo administrados pela Unesco para o gerenciamento do projeto”.
Resgate
Os R$ 11 milhões emergenciais enviados inicialmente pelo Ministério da Educação foram destinados ao trabalho de resgate das peças nos escombros do museu.
A vice-coordenadora do Núcleo de Resgate, Luciana Carvalho, explica que o trabalho foi dividido em quatro partes, iniciando com a organização das equipes e reuniões preparatórias para criar protocolos de atuação no resgate, após a tentativa emergencial de coletar materiais feita ainda durante o incêndio.
Atualmente o trabalho está na terceira fase, que é a retirada do material e catalogação do que foi resgatado, que deve continuar até o primeiro semestre de 2020. A quarta etapa, mais demorada, consiste em fazer o inventário e o relatório do material recuperado. No total, 47 funcionários do museu participam ativamente do resgate, além de estudantes de graduação e pós-graduação.
“O palácio tem cerca de 2 mil metros quadrados só na planta baixa, sem contar os outros pavimentos. Algumas áreas não desabaram, pouquíssimas. Essa planta baixa foi dividida em 71 áreas, dessas 50 já foram encerradas, nós já terminamos o trabalho de resgate nelas. Ainda temos 21 áreas a serem trabalhadas, aonde ainda existe acervo científico para ser retirado”.
Ela explica que não é possível mensurar o número total de peças resgatadas, pois muitas são catalogadas em lotes que podem chegar a centenas de peças. Até o momento, foram feitos 4.382 formulários de cadastro. Segundo Luciana, do total de 37 coleções científicas que o museu tinha, 46%, ou 17 coleções, foram quase totalmente perdidas ou parcialmente afetadas; 35% foram ou estão sendo resgatadas, num total de 13 coleções; e 19% não foram atingidas pelo incêndio, com sete coleções preservadas.
Hoje, os pesquisadores apresentaram peças resgatadas da Coleção Tereza Cristina, de arte pré-colombiana do Peru, partes de uma armadura samurai do Japão e itens da coleção egípcia, que já teve mais de 300 peças resgatadas.
“As coleções que estavam dentro de armários de aço resistiram mais, ainda que esses armários tenham sido danificados pelo incêndio. Tem peças como cerâmicas, estatuetas, que estão em excelente estado de preservação, ainda que a gente note danos relacionados ao incêndio, como quebras, fraturas e esmaecimento de cores relacionados ao processo de calor e do incêndio”.
Virar a página
O diretor do Museu Nacional, Alexander Kellner, destacou que é preciso “virar a página”. Ele afirmou que o incêndio “foi uma tragédia enorme”, mas que é necessário trabalhar e aprender com os erros para reconstruir “o museu mais antigo do país”.
“Temos que aprender alguma coisa com isso e relembrar que a perda foi imensa. O teto da sala do trono era adornada com as deusas da mitologia grega, essa sala não existe mais. Milhões de exemplares retratando a biodiversidade brasileira e também internacional, além de material etnográfico extremamente valioso para a cultura e a ciência humana, destruídos. A destruição foi intensa”.
Como saldo positivo da tragédia, Kellner destacou a “grande empatia da sociedade” e a solidariedade internacional, com diversos países e instituições oferecendo ajuda financeira e técnica para a reconstrução. Ele destacou que o museu vai lançar esta semana o Relatório Anual 2018, com todas as atividades desenvolvidas, que ficará disponível on-line em inglês e em português.
Segundo Kellner, no momento está sendo feito o projeto executivo para a restauração da fachada e do telhado do palácio, mas ainda não há previsão do custo dessa obra. Ainda serão feitos mais dois projetos executivos: um para a restauração interna do palácio e outro do plano museológico para definir a ocupação dos espaços com as exposições.
A princípio, segundo ele, foram pensados quatro circuitos expositivos para o novo Museu Nacional. “O primeiro é o Circuito Histórico, quem morou lá, com toda a trajetória até a tragédia. Outro é o Circuito do Universo e da Vida, com a visão científica da história do universo. O terceiro é o da Complexidade Cultural. Aqui temos problemas, não vamos conseguir atuar sem a ajuda de parceiros nacionais e internacionais, com doação de acervo original. E o Circuito dos Biomas Brasileiros, envolvendo a América do Sul de maneira geral”.
Mesmo após o incêndio, o Museu Nacional conseguiu exibir algumas de suas peças em exposições feitas em outros espaços culturais. No início do ano, foi apresentada, no Centro Cultural Banco do Brasil no Rio de Janeiro, a mostra Museu Nacional Vive – Arqueologia do Resgate. Já a Casa da Moeda, também no Rio, recebe até setembro a mostra Quando Nem Tudo Era Gelo – Novas Descobertas no Continente Antártico.
Neste fim de semana o Museu faz novo festival na Quinta da Boa Vista e na segunda-feira será aberta a exposição Vila Santo Antônio de Sá, na Caixa Cultural do Rio de Janeiro. No dia 19 de setembro será inaugurada, no Congresso Nacional, a exposição Museu Nacional Vive – Memória e Perspectivas.
Kellner anunciou que a Academia Brasileira de Ciências (ABC) vai lançar um livro sobre o trabalho de resgate feito no Museu Nacional.
Edição: Lílian Beraldo