Direitos do Cidadão
10 de Setembro de 2019 às 17h45
Ministérios Públicos de Estados e da União apontam ilegalidades e inconstitucionalidades em decreto que alterou o Conanda
Em Nota Pública, Conselho Nacional de Procuradores-Gerais e a PFDC destacam enfraquecimento do colegiado e dizem aguardar que medida seja revista pelo governo federal
Foto ilustrativa: Pexels
O decreto presidencial nº 10.003 – publicado no último dia 4 para alterar a composição, a estrutura e o funcionamento do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) – é marcado por ilegalidades e inconstitucionalidades, e tem a evidente intenção de reduzir o caráter democrático do Conselho, além de fragilizar sua capacidade de cumprir as funções constitucionais a ele atribuídas.
O posicionamento é de representantes de Ministérios Públicos de Estados e da União e está expresso em uma Nota Pública lançada nesta terça-feira (10) pela presidência do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG) – por meio de seu Grupo Nacional de Direitos Humanos (GNDH) –, em conjunto com a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), que integra o Ministério Público Federal.
O documento defende a manutenção do processo democrático quanto à composição e funcionamento do Conanda, criado pela Lei 8.242/91 para dar cumprimento ao que determina a Constituição Federal no que se refere à prioridade absoluta de crianças e adolescentes e para assegurar participação social na formulação e no controle das políticas públicas voltadas a esse segmento.
“As questões e políticas que envolvem a criança e o adolescente, além de prioritárias, segundo a Constituição Federal, são extremamente complexas e desafiadoras, sendo o Conanda o formulador da política nacional, seu fiscalizador, além de lhe competir avaliar as políticas estadual e municipal, a atuação dos respectivos conselhos, dentre outras funções”, ressalta a Nota Pública.
Para o CNPG, o GNDH e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, o decreto presidencial não teve o propósito de aprimorar e fortalecer o colegiado. “Muito pelo contrário. O que esse ato impõe é a desconstrução do próprio Conanda – vale dizer: contra a sociedade e contra a prioritária obrigação de todos de proteger a infância e a juventude do Brasil”.
Ilegalidades e inconstitucionalidades – A Nota Pública elenca dez pontos centrais acerca das ilegalidades e inconstitucionalidades que marcam o recém editado decreto governamental. O documento inicia destacando que, ao determinar a dispensa de todos os membros do Conanda, o decreto desconsidera eleições legítimas e, na prática, promove a dissolução do Conselho, “por ato unilateral do chefe do Poder Executivo Federal – em franco desrespeito aos direitos das organizações da sociedade civil de exercerem até o final os seus atuais mandatos, adquiridos na forma da lei”.
O decreto nº 10.003/2019 também acaba por retirar do conceito do Conanda a função de órgão controlador da política destinada a crianças e adolescentes, violando disposição expressa de lei federal, além de subtrair do colegiado a prerrogativa de regulamentar e presidir os processos de escolha das organizações da sociedade civil – afrontando, assim, o dever de corresponsabilidade e a diretriz de participação social estabelecidos na Constituição Federal.
A Nota Pública também chama atenção para o fato de que a medida revoga a previsão de acompanhamento do processo de escolha dos representantes das organizações da sociedade civil pelo Ministério Público Federal, menosprezando a atribuição constitucional do Ministério Público de zelar pelo regime democrático e pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição.
Ainda de acordo com a Nota Pública, o decreto governamental enfraquece a capacidade de trabalho do Conanda, uma vez que revoga a possibilidade de comissões permanentes e limita a apenas três a atuação de grupos temáticos operando simultaneamente.
“Somando-se a isso a quebra afrontosa do princípio da paridade, a subtração total do suporte financeiro e a sonegação à sociedade civil de conduzir o processo de escolha de seus representantes, tem-se um conjunto de violações que ferem não apenas dispositivos legais, mas também a garantia de prioridade, tal como prevista no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente e no artigo 227 da Constituição”.
Ao tratarem da força do texto constitucional que estabeleceu crianças e adolescentes como prioridades absolutas, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais, o Grupo Nacional de Direitos Humanos e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão destacam que a retirada de recursos financeiros do Conanda somente se justificaria, em tese, se o Governo Federal comprovasse antes ter feito o mesmo com todos os demais órgãos colegiados existentes na esfera federal, de qualquer natureza.
Proibição de retrocessos – A Nota Pública aponta que o ato do chefe do Poder Executivo Federal ofende o princípio da proibição do retrocesso nas políticas sociais públicas, já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. Além disso, atenta contra os princípios da administração pública, já que viola os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições.
“O Ministério Público, em seu lugar de instituição encarregada da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, espera e exige o devido respeito ao princípio constitucional da prioridade absoluta aos direitos da criança e do adolescente, bem como aos dispositivos legais, constitucionais e normas internacionais que consagram a política de atendimento socioeducativo como uma política de promoção e defesa desse segmento”.
Os signatários encerram o documento reafirmando sua oposição a toda e qualquer proposta que preconize o enfraquecimento do Conanda, “a espera que o Governo Federal possa rever imediatamente o Decreto Federal nº 10.003/2019 e devolver ao colegiado as suas prerrogativas e recursos necessários ao seu bom funcionamento”.
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