O ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão, foi exonerado por quebra de confiança. Foi o que afirmou, nesta terça-feira (17), o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes. O Inpe é vinculado à sua pasta. Pontes esteve na Comissão de Meio Ambiente (CMA) para explicar a crise que levou ao afastamento de Galvão no início de agosto.
Segundo o ministro, depois que dados do Inpe se tornaram o centro de um debate internacional sobre o desmatamento da Amazônia, Galvão tratou do assunto diretamente com o presidente da República, Jair Bolsonaro, sem envolver o ministério. Isso gerou uma situação “desconfortável” para todos, de acordo com Pontes.
— Durante o período da crise, ele deveria ter vindo até mim para conversar. Em vez disso, foi diretamente ao presidente. É difícil gerenciar institutos cujos diretores podem te “bypassar” [contornar, passar por cima]. Eu tenho que estar sabendo — argumentou.
Pontes destacou que Galvão, formado em engenharia e doutor em física, é um profissional de capacidade técnica reconhecida. A exoneração, afirmou ele, também não teve relação com os dados divulgados pelo Inpe, que estão corretos mas foram “mal interpretados”.
No início de agosto, o Inpe divulgou dados do Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia Legal em Tempo Real (Deter) relativos ao mês de julho, que indicavam um aumento de 278% nos alertas de risco de desmatamento na Amazônia em relação ao mesmo período do ano anterior. Os números foram repercutidos pela comunidade internacional e o órgão foi repreendido pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Depois de conceder uma entrevista criticando Bolsonaro, Galvão foi exonerado.
Dados
O ministro Marcos Pontes explicou à comissão que os dados produzidos pelo Deter não indicam desmatamento efetivo — essa responsabilidade é do Projeto de Estimativa de Desflorestamento da Amazônia (Prodes), cujo números são publicados apenas no fim do ano. O Deter identifica possíveis áreas de risco, a partir de imagens de satélites, e informa em tempo real aos órgãos de vigilância ambiental.
Pontes disse que os dados do Deter não podem ser analisados pontualmente, a partir de um único mês, porque interferências externas sobre a captação das imagens (como coberturas de nuvens sobre a região observada) levam a variações já esperadas em determinadas épocas do ano.
— Os dados têm que ser vistos como uma sequência e analisados por pessoas que entendem, para que sejam interpretados da maneira correta. Isso não foi feito. Saiu um artigo [com a interpretação errada] e disparou a situação.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) perguntou se o acontecido provocará alguma mudança no modelo de geração de dados do Inpe e na sistemática de anúncio das informações. Randolfe também quis saber sobre a possibilidade de substituir o Deter pelos serviços de alguma empresa privada.
Pontes respondeu que a divulgação será alterada a pedido do Ibama, que é um dos “clientes” do Inpe. Até o ano passado, o Deter disponibilizava os seus dados para o público cinco dias depois da produção. Essa prática será retomada. Ele garantiu que não haverá qualquer alteração nos dados dentro desse intervalo de tempo.
Sobre a parceria com o setor privado, Pontes defendeu a incorporação de outros satélites, inclusive pertencentes a empresas, ao sistema do Inpe, como forma de aprimorar o trabalho de monitoramento. Para ele, isso faz parte do dever que o ministério tem de ajudar o instituto a fazer o melhor trabalho possível.
Orçamento
A crise no Inpe pode ter tido um lado positivo, na avaliação do ministro. A atenção extra sobre o órgão pode favorecer uma mobilização em prol das suas atividades, que não se resumem a acompanhar o desmatamento. O Instituto também desenvolve satélites para uso na agricultura, na segurança nacional e no monitoramento de desastres, e em áreas de formação acadêmica.
— Podemos aproveitar esta situação para pensar em projetos que possam ajudar no desenvolvimento de outros setores do Inpe e usar o Congresso para nos ajudar nos orçamentos, que têm sido muito apertados para manter nossas unidades de pesquisa — avaliou.
Segundo Pontes, o orçamento previsto para o Inpe em 2020 é “basicamente de sobrevivência”, sem espaço para novas empreitadas. Além disso, muitos servidores estão próximos da aposentadoria. O órgão precisa renovar o seu supercomputador, responsável pela compilação e análise de dados, o que custaria cerca de R$ 120 milhões.
O ministro sugeriu que parte do fundo da Operação Lava-Jato que foi destinada à preservação da Amazônia seja usada para ajudar o Inpe. Ele disse que o órgão pode cooperar com iniciativas globais de combate às mudanças climáticas, se tiver estrutura para gerar modelos avançados e fazer previsões a partir de bases de dados mais amplas.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)