“A cada 40 minutos uma pessoa se mata. As taxas de suicídio dobram às sextas, sábados e domingos. Precisamos de projetos contínuos, conversas diárias, olhar toda hora para o lado humano do nosso aluno”. Professora de geografia, Sandra Mazzone provoca reflexões que vão além da disciplina nos estudantes da Escola Estadual Rubens Moreira da Rocha, em Santo André.
Na última sexta-feira, dia 20, diversas turmas saíram as ruas da unidade, localizada em região de classe média no ABC Paulista, para exibir faixas e conversar com pedestres e motoristas sobre a prevenção do suicídio e valorização da vida. Enquanto isso, a escola simplesmente parou para falar sobre o tema. Havia uma oferta imensa de atividades, como filmes educativos, uma peça de teatro sem diálogo – e feita pelos próprios jovens – conversas com professores e rodas entre os alunos, apenas para desabafarem e falarem sobre temas do cotidiano.
É a segunda vez que esse dia especial acontece no Rubens Moreira. A ideia começou numa parceria de Sandra e Mariglê Rampega, professora de arte na unidade. “Ano passado, promovemos esse grande “para” nas datas cívicas e no Dia dos Pais e no Dia das Mães. Vimos que poderíamos ampliar e fazer um pouco mais diferente nesse ano. Uma psicóloga veio fazer uma palestra e tivemos como destaque o filme e a peça do Pequeno Príncipe”, relata a docente, que também é formada em psicologia.
A passeata realizada nas ruas próximas foi considerado o ponto alto da ação, e mesmo com questões de logística – a Guarda Escolar foi chamada para garantir a segurança de todos – a ideia da direção é manter. “Foi emocionante demais. Na hora que abriu a porta, todo mundo de amarelo, com a faixa, todos se sentindo protagonistas…Teve uma menina que estava com o cartaz do abraço e foi de arrepiar: ela ia nos carros, no comércio, perguntava para as pessoas no caminho”, relata cuidadosamente a professora Mari, como é chamada pelos jovens.
“Nunca tinha ouvido falar do Setembro Amarelo até estar aqui. Quando os professores falaram, me senti que eles se importassem comigo. É como se eles estendesse o braço para alguém que tá há nove anos num buraco” – Evelyn Salustiano, do 9ª ano do Ensino Fundamental
Localizada num bairro de classe média no ABC, a Escola Estadual Rubens Moreira da Rocha é conhecida pela qualidade do ensino que chama atenção de moradores de regiões de necessidade social, como o Jardim Elba e a COHAB Teotônio Villela, na Zona Leste da Capital. “Nosso bairro está envelhecendo, mas a escola é diversa. Recebemos muitos jovens que trabalham, jovens com famílias mais delicadas. Tratar da saúde mental aqui é fundamental”, relata Sandra.
Uma dessas jovens foi especialmente tocada pelo Setembro Amarelo. Aos 14 anos, Evelyn Salustiano está no 9ª ano do Ensino Fundamental e em sua terceira escola nos últimos três anos. Ela fala abertamente sobre o diagnóstico de depressão, as tentativas de suicídio e o recomeço na unidade.
“Nunca tinha ouvido falar do Setembro Amarelo até estar aqui. Quando os professores falaram, me senti que eles se importassem comigo. É como se eles estendesse o braço para alguém que tá há nove anos num buraco”, relata a jovem, que é reconhecida como uma espécie de referência entre os jovens pela coragem com a qual trata do tema. “A Evelyn nos ajudou a entender muitas coisas, especialmente porque alguém desiste da vida e tenta a morte. Ouvir falar ela é sempre bom”, relata Fabio Daniel, do 2ª ano da Ensino Médio.
“Saúde Mental é coisa séria e tema de aula”
As aulas da professora Sandra abordam assuntos tão distintos que saem dos mapas da geografia. É o tema da saúde mental que a professora, também uma conselheira entre os jovens, mais bate na tecla. “Coloco para os jovens que ninguém é 100% feliz. Nem todo mundo é equilibrado ou está sempre satisfeito. O que esses jovens precisam é de equilíbrio, de sentirem carinho e atenção. O que mais ouço aqui é que eles não aguentam mais”, desabafa.
Documentários sobre depressão, ansiedade e aceitação estão entre os instrumentos de aula, que também têm atividades de protagonismo, rodas de conversa e também motivação, como uma cantoria coletiva da música “Tente Outra Vez”, de Raul Seixas.
“Saúde Mental é coisa séria e tema de aula”, alerta Sandra. O Setembro Amarelo, que termina na próxima segunda, não é apenas sobre a cor ou sobre o mês, mas sim sobre atividades conjuntas que possam escutar cada ser humano por trás de cada aluno. Atividades que possam fazer da escola um lugar onde se conquiste não apenas conhecimento, mas também felicidade e aceitação.