MARIANE MANSUIDO
DA REDAÇÃO
Nesta quinta-feira (19/09), a Comissão Extraordinária de Defesa de Direitos Humanos e Cidadania e a Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, do Adolescente e Juventude realizaram reunião conjunta com representantes de vários setores da sociedade. O objetivo foi debater meios de a rede de proteção a crianças e adolescentes, inclusive o Legislativo paulistano, coibir casos de tortura na capital.
A discussão foi suscitada pelo caso do jovem de 17 anos que foi chicoteado por seguranças de um supermercado na zona sul da cidade, pelo suposto furto de quatro barras de chocolate. A ocorrência foi registrada no início deste mês. Desde então, órgãos públicos de proteção aos direitos humanos, além das próprias secretarias competentes da prefeitura, acompanham os desdobramentos.
Reivindicações dos conselheiros
Presente à reunião, Ariel de Castro, advogado e integrante do CONDEPE-SP (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo), acompanha as investigações desde o início. Para Castro, a ação dos seguranças não pode ser tolerada – e remete à época da escravidão no Brasil.
O advogado disse ainda que a falta de impunidade, juntamente com discursos de autoridades brasileiras, reforça a violência contra jovens negros e periféricos, dificultando medidas mais concretas de combate. “Certos discursos de autoridades, estaduais e nacionais, colaboram para essa situação de barbárie. As pessoas praticam esses atos incentivadas também por esses discursos”, afirmou Castro, para quem o fato de a tortura ter sido filmada demonstraria que os autores a consideram “legal ou admissível”.
Para Carlos Alberto de Souza, presidente do CMDCA (Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente), a falta de estrutura dos Conselhos Tutelares de São Paulo prejudica a prestação de melhores serviços à população. E faz com que situações como essa ainda sejam corriqueiras.
Souza disse considerar que os cortes dos recursos públicos tem prejudicado o trabalho dos órgãos competentes. “Estamos passando por um processo de eleição dos conselheiros de São Paulo, e nem mesmo isso tem o mínimo de estrutura. Infelizmente, temos cortes em políticas sociais no momento. E isso contribui para que atos de violência continuem acontecendo, só depois é que o Estado corre atrás do prejuízo”, disse o presidente do CMDCA.
Presidente do Fórum Municipal de Assistência Social, Regina Paixão cobrou políticas mais abrangentes para a juventude, além de mais diálogo com Executivo e Legislativo. “Temos muito que fazer e discutir não só para infância e adolescência, mas também para a juventude, que infelizmente está largada. Temos que ter mais audiências para dialogar com o Poder Público, especialmente sobre os recursos da área, que estão cada vez mais escassos”, disse Regina.
Posição do Poder Público
Ana Carolina Shawan, chefe do Núcleo de Defesa da Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, contou que o órgão tentou contato com o jovem agredido, mas ainda não acompanha de perto o caso.
Segundo Ana Carolina, a ocorrência chama atenção para a falta de políticas públicas destinadas a crianças e adolescentes em situação de rua. “Eles têm apenas o acolhimento como opção, mas suas peculiaridades são ignoradas, o que acarreta a fuga desses jovens desses espaços”, afirmou a defensora pública. “Não existe, assim como há para adultos, um equipamento em que eles possam comer ou tomar banho. Assim, eles continuam nas ruas, em uma situação ainda mais vulnerável”, argumentou.
Presente à reunião, Elisa Lucas, secretária-adjunta da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania, disse que a pasta irá cobrar uma ação mais efetiva dos supermercados de São Paulo. “Sabemos que o caso que ocorreu não é o primeiro. Por isso, vamos fazer uma reunião com a Associação dos Supermercados, para propor uma formação aos seguranças desses estabelecimentos, e assim criemos uma situação de mais respeito à diversidade e cidadania”, afirmou a secretária-adjunta.
Mais vagas
Para o secretário-adjunto da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Marcelo Del Bosco, é necessário expandir a discussão a outros estabelecimentos com ocorrências contra menores negros e pobres, como shoppings.
Del Bosco admitiu que faltam serviços de atendimento à população mais vulnerável. “Temos um problema no Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes porque alguns são só portas de entrada, ou seja, ele será acolhido, mas terá que aguardar uma vaga em outro território”, explicou Del Bosco. Segundo o secretário-adjunto, um dos objetivos da pasta é criar um núcleo de convivência para crianças e adolescentes que, além de acolhimento, também ofereça atividades e serviços.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos, o vereador Eduardo Suplicy (PT) disse que o caso do jovem agredido no supermercado reforça a necessidade de mais políticas públicas que protejam crianças e adolescentes. “Temos que pensar quais medidas podem prevenir situações como essas, em que meninos e meninas são levados às ruas, se envolvem com drogas e, por falta de acolhimento familiar e social, tornam-se vítimas”, disse Suplicy.
A vereadora Soninha Francine (CIDADANIA23), presidente da Comissão da Criança e Adolescente, apoiou a necessidade de buscar mais recursos para a assistência social. “É difícil mexer no orçamento com muita liberdade, mas temos que olhar com mais atenção porque precisamos de mais vagas em serviços de acolhimento e também em unidades de apoio à saúde mental”, disse Soninha, que chamou atenção para a necessidade de a peça orçamentária prever esses investimentos.
Também participaram da reunião os vereadores Juliana Cardoso (PT), vice-presidente da Comissão da Criança e Adolescente, Celso Giannazi (PSOL), Fernando Holiday (DEM) e Rodrigo Goulart (PSD).