No esporte e na vida, uma das formas de tornar um triunfo ainda mais saboroso é fazer isso de forma inesperada, desafiando prognósticos. Não seria muito difícil enumerar acontecimentos esportivos que talvez na letra fria dos resultados não tenham gerado grandes frutos, mas que deixaram uma marca simplesmente pelo fato de terem ocorrido quando não havia expectativa. A vitória do Brasil diante da Grécia, pela Copa do Mundo de Basquete, se encaixa nessa descrição. Por enquanto, ainda não representou conquista significativa, mas colocou o basquete e a seleção brasileira no radar de quem acompanha esporte, em boa parte porque muita gente esperava uma derrota contra o time do super astro Giannis Antetokounmpo. Para acrescentar ainda mais pimenta às discussões, o Brasil fechou a primeira fase com três vitórias em três jogos. Agora, aqueles que assistiram incrédulos ao momento sublime frente aos gregos já inverteram a lógica: expectativas foram criadas. Para a seleção, o que vem de fora talvez não faça diferença. Mas para quem consome e vive esporte, esse jogo de ‘acredito ou não acredito’ é parte fundamental do envolvimento com o espetáculo. Por isso, é bom contextualizar as coisas.
Uma figura crucial nessa equação é a do técnico croata Aleksandar Petrovic, que empregou um jogo de disciplina tática e uso inteligente das peças à disposição. Acontece que Petrovic assumiu a equipe há menos de dois anos. A seleção vinha de uma má participação nos jogos do Rio, em casa, quando sequer avançou de fase. Posteriormente, ficou temporariamente suspensa de competições internacionais, depois que a Confederação Brasileira de Basquete não cumpriu algumas exigências da FIBA. O calendário das Eliminatórias para a Copa do Mundo ocupou muitas datas em que alguns dos principais atletas, atuando nos Estados Unidos e na Europa, não poderiam estar presentes. Mesmo assim, o Brasil conquistou a vaga sem maiores dificuldades. Petrovic então correu atrás do comprometimento dos jogadores que defendem equipes da NBA. Conseguiu. Apenas o armador Raulzinho, se recuperando de lesão, não está com a seleção na China.
Petrovic começou a desenhar mentalmente formas de parar os adversários. Em março, logo após o sorteio dos grupos da Copa do Mundo, já exibia otimismo em bater a supostamente favorita Grécia. Ao longo do período de preparação, já com o grupo completo, foi surgindo um esboço do que esperar da seleção, com apenas uma derrota para a França. Ele apostou na continuidade de uma base que se conhece há muito tempo, com Anderson Varejão, Leandrinho, Marquinhos e Alex, esse último o quase ‘quarentão’ a quem o técnico atribuiu a maior parte da tarefa de marcar Antetokounmpo. Além disso, pinçou os melhores talentos jovens do Brasil para impedir que o time sofresse com a compreensível falta de gás de um elenco mais veterano. A campanha perfeita até aqui mostra que talvez a descrença com relação à seleção fosse um exagero, considerando o trabalho que vem sendo feito. Porém, mesmo com o sucesso relativamente surpreendente, é prudente frear um pouco a avalanche de novas expectativas.
No atual contexto do basquete mundial, um bom desempenho não deve ser medido pela simples capacidade do Brasil de disputar pódios ou uma classificação para a próxima Olimpíada. Até agora, já enfrentamos a Grécia (oitava colocada no ranking mundial), encararemos os Estados Unidos (primeiro colocado) e pela frente teríamos possivelmente França (terceira colocada), Lituânia (sexta colocada) ou Austrália (11ª), todas elas à frente do Brasil (12º). Isso apenas no caminho até as quartas-de-final. Na briga por uma das duas vagas das Américas nos jogos de Tóquio, além dos americanos, a Argentina (quinta do mundo) surge como grande obstáculo. Estamos falando de alguns dos melhores times do planeta. Em certos momentos, essas barreiras serão superadas, como já aconteceu nessa mesma Copa do Mundo. Porém, se isso não se repetir, deve ser encarado com naturalidade. É possível pesar as virtudes e fraquezas do elenco brasileiro e fazer um prognóstico equilibrado. Os muitos atletas que estão próximos do fim de carreira por um lado não são mais protagonistas no maior basquete do mundo, mas por outro acumularam anos de experiência no mais alto nível. Os jovens ainda não terminaram de maturar e podem cometer erros bobos, como o de Didi no fim do jogo contra a Grécia, mas oferecem sangue novo e vontade de conquistar espaço. A figura completa mostra que não há motivos para pensar que é impossível. Também não é simples. Um adjetivo mais certeiro: difícil. Para os jogadores, enquanto houver mais um jogo no sábado e outro na segunda, tudo estará bem. Já para quem deseja tanto ver o basquete brasileiro indo bem, não exagerar nas expectativas é um bom caminho para continuar apreciando uma jornada que tem sido muito prazerosa.
Edição: Verônica Dalcanal