O advogado-geral da União, André Luiz Mendonça, defendeu a criação de um marco legal que dê segurança jurídica ao gestor público para que faça “o que é certo, sem medo de inovar na resposta aos anseios da sociedade”. Ele falou em audiência pública aos senadores da Comissão de Infraestrutura (CI) na manhã desta terça-feira (24).
Mendonça alertou que o Brasil pode passar por um “apagão das canetas”, ou seja, gestores — secretários, prefeitos, governadores — que deixam de decidir por insegurança ou receio de mais tarde terem o ato questionado pelos órgãos externos de controle, a exemplo do Tribunal de Contas da União (TCU).
— Os órgãos de controle têm cada vez mais invadido a análise técnica que cabe ao Poder Executivo — sintetizou Mendonça.
Para ele, transferir a discricionariedade do gestor aos órgãos de controle de maneira que avaliem previamente as decisões antes de serem tomadas para garantir segurança jurídica total ao ato seria uma opção legislativa a ser respeitada, mas essa orientação não está na Constituição Federal até esse momento.
— Diante disso, precisamos respeitar a opção do administrador público que decide dentro das regras da Constituição, fundamentado pelo corpo técnico do Executivo e levando em conta a teoria dos motivos determinantes. Depois disso, cabe aos órgãos de controle coibir os desvios de poder, a arbitrariedade, a corrupção e o que fugir ao razoável e ao proporcional.
Mendonça também pediu aos senadores mais diálogo com o Poder Legislativo neste momento “em que os desafios para o crescimento econômico são gigantescos e envolvem políticas de infraestrutura”. De acordo com o advogado, o papel do Estado nesse contexto é de extrema relevância e frequentemente questionado.
Concurso
André Mendonça explicou durante a audiência que a Advocacia Geral da União (AGU) tem mais de 19,5 milhões de processos judiciais em andamento, sendo mais de 5 milhões apenas na área previdenciária. De acordo com ele, a maioria dos processos poderia ser tratada por analistas judiciários e de contabilidade bem preparados para dar subsídios aos advogados da União.
— Não seria necessário ter um membro da AGU trabalhando em cada um desses processos, ele poderia gerenciar uma equipe de analistas, contadores e peritos.
Isso não acontece porque, segundo Mendonça, não há uma carreira administrativa própria da AGU. Ele pediu que o Congresso aprove lei que regulamente a carreira administrativa do órgão porque, embora haja advogados suficientes no quadro, eles fazem o serviço quase sem apoio de servidores formados em Direito e Contabilidade.
— A carreira administrativa não foi estruturada e a maior parte dos servidores que lá trabalham foram cedidos na época em que a AGU foi criada e já estão se aposentando.
Infraestrutura
O advogado explicou que, nos seis últimos meses, a AGU conseguiu garantir R$ 43 bilhões em investimentos de infraestrutura a partir da atuação judicial. O senador Esperidião Amin (PP-SC) comentou a realidade do Orçamento para 2020 na área de investimentos, que conta com R$ 19 bilhões (cerca de 0,5%) de fonte própria. Para 2021, ele disse imaginar quase zero.
— Só restam ao governo os contratos de concessão e parcerias público-privadas, se quisermos generalizar. E a empresa privada inadimplente num contrato de concessão é inatacável, ele fica com razoável segurança de que não será molestada.
Amim questionou o contrato de concessão da BR-101 Sul, cuja empresa estaria inadimplente há anos. Se no sul a BR 101 tem problemas, no norte não parece ser diferente. Rodrigo Cunha (PSDB-AL) reclamou da morosidade da parte final da duplicação da rodovia em Alagoas e pediu providências. De acordo com André Mendonça, a finalização da obra está na lista das prioritárias e não há entrave legal sobre ela.
Rodrigo também citou a construção de uma obra bilionária, o Canal do Sertão, obra que levaria água ao agreste alagoano e na qual foram gastos mais de R$ 2,5 bilhões, mas atualmente apresenta vários gargalos, segundo ele.
— O investimento inicial precisa aumentar quanto mais o tempo passa e existe uma depreciação dos recursos já empregados. Independentemente de que governo tenha começado, existe a responsabilidade de terminar, porque esse canal vai levar água para mais de 40 municípios e mais de um milhão de pessoas.
Mendonça prometeu averiguar e citou que a integração do São Francisco avança na Câmara de Conciliação da Administração Pública Federal.
— Essa negociação envolve diretamente os governadores de quatro estados (RN, PB, PE e CE) para viabilizar a distribuição da água por dois grandes canais. Teremos um acordo que vai viabilizar a distribuição de água a menor custo e com menor impacto ambiental, através do uso de energia solar para bombear a água.
Fabiano Contarato (Rede-ES) criticou a oferta de blocos de petróleo pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) localizados no território marinho onde está localizado o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. De acordo com ele, o presidente do Ibama teria se manifestado contrariamente à exploração.
— Estamos aguardando os dados técnicos para nos manifestar sobre essa ação — explicou André Mendonça.
Energia
O presidente da CI, senador Marcos Rogério (DEM-RO), criticou com veemência o empreendimento da usina hidrelétrica de Belo Monte que, de acordo com ele, não tem viabilidade econômica e, por causa do sistema de fio d’água, deve gerar menos energia que o potencial esperado.
— Um empreendimento inicialmente orçado em R$ 19 bilhões vai superar R$ 40 bilhões gerando apenas um terço da energia que tem capacidade, além de ser fonte intermitente. Isso é um crime contra o interesse nacional e trata-se da pior decisão do ponto de vista do interesse coletivo.
Trânsito
A suspensão do uso de radares fixos, móveis e portáteis nas estradas federais, determinada em agosto pelo presidente Jair Bolsonaro, também foi tema de debate na audiência. Contarato se opôs à ideia de que eles tenham natureza arrecadatória.
— Não sou a favor da indústria de multas, mas também não sou a favor da indústria da morte.
Ele classificou a medida de “populista” e disse atentar contra a vida e a segurança das pessoas, uma vez que o Brasil registra 50 mil mortos todos os anos nas estradas brasileiras e 400 mil mutilados.
Mendonça esclareceu que um acordo foi feito com o Ministério Público Federal para que mais de mil radares sejam reavaliados e readequados. Ele contou que quatro órgãos (ANTT, DNIT, Polícia Rodoviária Federal e Denatran) fazem um estudo conjunto sobre radares nas rodovias federais.
O senador Eduardo Gomes (MDB-TO) saiu na defesa do governo Bolsonaro dizendo que, mesmo com os radares fora de uso, o número de acidentes diminuiu. Ele também disse que o valor pago pelo cidadão para tirar carteira de habilitação (CNH) ficou bastante reduzido desde o início do ano.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)