02/08/19 14h21
Fintech atingiu valor de mercado de US$ 10 bilhões. Conversamos com especialistas para saber se o próximo decacórnio está virando a esquina
It Mídia
Na última semana, o Nubank atingiu um novo patamar no mercado. Após receber aporte de US$ 400 milhões Serie F liderado pela Woody Marshall, a fintech brasileira deu um salto sem precedentes no mercado de startups brasileiras: bateu um valuation de US$ 10 bilhões, cativando uma nova aura na mitologia do ecossistema empreendedor, o chamado decacórnio. Para colocar as coisas em perspectiva, ao longo de sete rodadas de investimento, o Nubank já levantou cerca de US$ 820 milhões.
A escalada da fintech brasileira se deu em um curto espaço de tempo. Era março de 2018, quando o Nubank atraía manchetes por virar o terceiro unicórnio brasileiro, ao lado de PagSeguro e 99. Em outubro de 2018, era a vez de superar os US$ 4 bilhões em valoração após um investimento de US$ 180 milhões feito pela gigante chinesa da internet Tencent.
Mas afinal, o que torna uma startup tão valiosa aos olhos de investidores? “Por trás de toda startup, você tem o que a gente chama de units economics, que é quando você consegue provar que você tem o tamanho de um mercado, o tamanho do mercado interessado, e o quanto custará para trazer estas pessoas para o seu negócio. Fazendo essa regra de três, eles conseguem provar para o investidor o crescimento de empresa”, explica Amure Pinho, presidente da Associação Brasileira de Startups (ABStartups), em entrevista ao IT Trends.
Para além do crescimento no número de pessoas que contam com o cartão roxinho do Nubank – são mais de 12 milhões – o Nubank também tem expandido sua oferta de produtos, incluindo a NuConta e mais recentemente a anunciada Conta PJ. Soma-se a isso, a expansão na América Latina, com escritórios inaugurados no México e Argentina. O panorama é de crescimento. Na visão de Bruno Rondani, fundador do 100 Open Startups, parte da valoração astronômica do Nubank reflete um mercado brasileiro em transformação. “O Nubank é um banco digital com toda a capacidade de funding para entrar na mesma liga que gigantes como Brasdesco, Itaú, Santander. Seu valuation segue a curva de crescimento que conseguiu executar em um mercado que comporta um crescimento ainda muito maior”, avalia.
Quando veremos o próximo decacórnio brasileiro?
Segundo lista do CB Insights, o Nubank se encontra na 21ª posição das startups mais valiosas do mundo. Entre as primeiras do ranking estão a chinesa Toutiao, dona do Bytedance, a Didi Chuxing, que detém a 99, a JUUL Labs, do varejo, a WeWork e Airbnb. O Brasil conta com mais de 12 mil startups atualmente e sete delas – fora o Nubank – detém o selo “unicórnio”: 99, iFood, Movile, Gympass, Stone, Arco Educação e Loggi.
As apostas para o próximo decacórnio brasileiro já estão sendo levantadas. “Movile, ao meu ver, é a próxima startup a atingir esse patamar, eles tem iFood no portfólio, Wavy e diversas outras apostas muito promissoras”, destaca Rondani. Amure acredita que ainda levará um tempo para vermos uma nova startup brasileira a superar o valor de US$ 10 bilhões. “Eu não acho que a gente verá uma nova decacórnio, pelo menos, nos próximos dois anos. O valuation é muito alto. Se você lembrar que elas viraram unicórnio no ano passado e que a cada dois anos uma startup do tamanho deles cresce três ou quatro vezes, a probabilidade de esses unicórnios atuais se tornarem decacórnios, talvez, em dois a três anos”, reflete. Entre as startups que estão na rota para seguir os mesmos passos do Nubank, na visão de Amure, estão as de meios de pagamento Stone e PagSeguro.
Na mira dos investidores estrangeiros
As startups da América Latina, com destaque para o Brasil, têm atraído nos últimos dois anos os olhares de fundos de investimento estrangeiros. Recentemente, a multinacional japonesa Softbank anunciou um fundo de US$ 5 bilhões dedicado às jovens empresas de tecnologia na região. Na ocasião, em comunicado, o CEO e chairman da SoftBank, Masayoshi Son afirmou que o aporte previa a efervescência da região: “a América Latina está a caminho de se tornar uma das regiões econômicas mais importantes do mundo, e prevemos um crescimento significativo nas próximas décadas”, declarou. Um dos aportes mais altos do fundo foi na colombiana Rappi, com US$ 1 bilhão investidos na startup de delivery. Para Rondani, a Softbank terá um papel importante na escalada dessas startups.
“O mercado de Venture Capital está amadurecendo e aquecido. A tendência ainda é de muito crescimento. A Softbank, sozinha, irá liderar a criação de muitos unicórnios no curto prazo e isso acaba estimulando toda a cadeia, desde anjos, fundos early stage até a entrada de outros grandes fundos internacionais ao Brasil como estamos vendo”, explica.
O interesse no Brasil também se dá por uma série de fatores que brilham aos olhos de investidores de fora do País. “Existe uma conjuntura econômica de países emergentes, você tem países emergentes que estão crescendo suas economias como México e Chile. Mas a diferença é que, comparado com os outros, você não consegue ter um país de economia emergente que tenha um mercado interno como o Brasil. Me diz qual país do mundo que tem uma economia emergente e uma população com mais de 200 milhões de consumidores? Do tamanho do Brasil, só o Brasil. Somos o maior país da América Latina, e a gente é competitivo como qualquer outro país emergente. Por isso que o Brasil está produzindo tantos unicórnios B2C para investimentos”, avalia Amure Pinho.
“Não, não estamos numa bolha”
Há dois tipos de pessoas no mercado de capitais e de startups: aquela que vê com otimismo o crescimento e diversificação do ecossistema e aquela que vê o mesmo panorama com ceticismo. Para Rondani, não há a atmosfera de bolha, que preocupava investidores há 20 anos, quando ainda usávamos o termo “boom” para falar sobre a Internet. No caso das startups, Rondani, vê como reflexo do amadurecimento do mercado e do empreendedor local.
“O que estamos vendo agora é um ajuste de capital empreendedor ao mesmo tempo que a tecnologia viabiliza o surgimento desses empreendimento que, agora, estão se transformando em unicórnios. O valuation das startups brasileiras está sendo ajustado a níveis internacionais”, compara.
Amure também defende o amadurecimento do ecossistema e reforça o valor que as startups brasileiras estão sabendo entregar para seus consumidores. “Acho que as startups estão levantando dinheiro com investidores muito maduros, que investem em todos os lugares do mundo. Eu acho que, pelo contrário, é uma nova fase que as pessoas não perceberam que há investimento em abundância no Brasil. Isso não é uma bolha, é um sonho que está se realizando na verdade. É isso que a gente sempre pediu, que a nossa inovação, que o nosso capital inovador saísse do agronegócio tradicional, do modelo antigo, para levar tecnologia. E a gente conseguiu isso. Então, o B2C está maduro, os unicórnios não são à toa. Esses unicórnios, como Nubank, 99, iFood, todos perceberam que eles entregam muito valor à sociedade. Eu uso todos os dias, você usa, são negócios reais. Estamos em uma maturidade emergente, com população de altos números consumidores, onde temos uma penetração mobile de tecnologia acima da média. A gente atingiu a primeira fase da abundância de investimento que nem é abundância, estamos vivendo a primeira fase de grandes investidores apostarem no Brasil como o país da América Latina”, conclui Amure.